O casual encontro entre o percussionista Steve Reid e o mentor do projecto de electrónica abstracta Four Tet, Kieran Hebden, conhece novo desenvolvimento, depois do imprevisto sobressalto que as sessões improvisadas registadas no duplo The Exchange Sessions, do ano transacto, conseguiram junto da comunidade melómana. Reid é um consagrado do orbe clássico do jazz - ainda que no injustamente "relativizado" papel de assistente de Ornette Coleman, Sun Ra, Miles Davis, James Brown ou Fela Kuti - e procura, neste Tongues, convergências com uma estética electrónica fiel à fruição na informalidade (aí residindo um importante factor de paridade entre os universos representados pelos dois músicos) e os sons de síntese, substâncias obviamente mais caras aos mundos de Hebden. No fundo, a proposta não diverge substancialmente dos trabalhos anteriores, assemelhando-se à continuidade lógica do entrosamento entre dois músicos que, sendo cultores de idiomas e gerações sonoras distintas, parecem ter encontrado uma linguagem comum. Pena é que Reid e Hebden se tenham imposto um certo pragmatismo temporal, ao contrário do que acontecera nas gravações da Exchange, trinchando os improvisos em volta dos cinco ou seis minutos. Com isso, os trechos resultam mais lacónicos e "convencionais", assim prescindindo de parte nuclear dos processos de especulação e experimentalismo, mormente através do abreviamento dos ciclos de crescimento das ideias. E esse (dispensável) compromisso de urgência, em último caso, subtrai algum fascínio às peças, não obstante a riqueza conceptual do disco.
sexta-feira, 30 de março de 2007
Kieran Hebden & Steve Reid - Tongues
O casual encontro entre o percussionista Steve Reid e o mentor do projecto de electrónica abstracta Four Tet, Kieran Hebden, conhece novo desenvolvimento, depois do imprevisto sobressalto que as sessões improvisadas registadas no duplo The Exchange Sessions, do ano transacto, conseguiram junto da comunidade melómana. Reid é um consagrado do orbe clássico do jazz - ainda que no injustamente "relativizado" papel de assistente de Ornette Coleman, Sun Ra, Miles Davis, James Brown ou Fela Kuti - e procura, neste Tongues, convergências com uma estética electrónica fiel à fruição na informalidade (aí residindo um importante factor de paridade entre os universos representados pelos dois músicos) e os sons de síntese, substâncias obviamente mais caras aos mundos de Hebden. No fundo, a proposta não diverge substancialmente dos trabalhos anteriores, assemelhando-se à continuidade lógica do entrosamento entre dois músicos que, sendo cultores de idiomas e gerações sonoras distintas, parecem ter encontrado uma linguagem comum. Pena é que Reid e Hebden se tenham imposto um certo pragmatismo temporal, ao contrário do que acontecera nas gravações da Exchange, trinchando os improvisos em volta dos cinco ou seis minutos. Com isso, os trechos resultam mais lacónicos e "convencionais", assim prescindindo de parte nuclear dos processos de especulação e experimentalismo, mormente através do abreviamento dos ciclos de crescimento das ideias. E esse (dispensável) compromisso de urgência, em último caso, subtrai algum fascínio às peças, não obstante a riqueza conceptual do disco.
quarta-feira, 28 de março de 2007
Pole - Steingarten
A música de Stefan Betke é daquelas coisas que não têm definição imediata mas o produtor berlinense tem-se mantido fiel a uma estética que fez dele um dos símbolos da esfera IDM, família de música minimalista de produção sintética. Depois de uma tentativa menos bem conseguida de juntar ingredientes típicos do hip-hop às suas construções, registada no álbum homónimo de 2003, Betke regressa ao habitat onde respira melhor. A fórmula Pole é redundante, não no sentido depreciativo da expressão, mas porque a estruturação melódica do trabalho assenta fundamentalmente num método circular, com pontos de partida e chegada consonantes - privilégio de loops meticulosos - e a insistência na redução da electrónica à sua dimensão mais orgânica. A novidade deste Steingarten, porém, está na adesão às causas mais atmosféricas, por oposição ao habitual primado da desconstrução do dub. Não é que essa regra seja largada definitivamente, pois as referências são notórias nos detalhes das peças do alinhamento, mas há uma reordenação do perfil das composições rumo a uma tapeçaria de sons fragmentada (por definição) e, ainda assim, capaz de promover estados zen. E esses argumentos, tão bem aduzidos em trechos como "Jungs" ou "Winkelstreben", raras vezes foram antes ouvidos (e sentidos) no trabalho de Betke. Para escutar em abstracção.
Posto de escuta Sítio da Boomkat
terça-feira, 27 de março de 2007
Blasted Mechanism - Sound in Light
Com mais de uma década de estrada e palcos, os Blasted Mechanism rendem-se definitivamente ao impulso místico da sua música. Se essa afinidade com o lado espiritual esteve sempre presente nos trabalhos anteriores, ou não fossem eles cultores de um qualquer tribalismo futurista (ou, à falta de melhor definição, de um interesse quase "religioso" por civilizações, criaturas e idiomas esquecidos ou imaginados), nunca como no duplo Sound in Light/Light in Sound ela se declarou tão abertamente. Em vinte e cinco trechos, a sofisticação do som rústico e tribal continua a ser a imagem de marca da banda, com as costumeiras influências de tons oriundos das mais diversas latitudes e géneros, do dub-funk mais esotérico, ao rock incendiário, à electrónica de absorção rápida (matéria menos tímida do que no passado) e às mais itinerantes formas de expressão musical, agregadas sob o signo da unificação espiritual das gentes do mundo ("unite the tribes"). Além desse desígnio redentor - coisa messiânica a que só um conceito conceptualmente nómada como os Blasted Mechanism se poderia propor - o improviso e a experimentação firmam um paradigma novo no grupo, especialmente no segundo disco (com mais dez composições), onde se revelam inúmeros alvitres sobre os atalhos vindouros do som da banda. Afinal, é essa porta escapista a saída que há-de levá-los à próxima mutação...
domingo, 25 de março de 2007
Dälek - Abandoned Language
O percurso do projecto Dälek está nos antípodas da invasão de simplismo que tomou conta do hip-hop de massas nos últimos anos. A DJ Oktopus e MC dälek, elementos criativos do conceito, pouco importam as modas ou os quesitos do mercado discográfico. Fiéis a uma estética própria que lhes valeu o respeito da comunidade underground, atingem, ao quarto registo de estúdio, o auge de maturação que se adivinhava antes, prosseguindo na exploração de sinergias improváveis entre o underground rap e uma miríade de sons importados de universos paralelos ao género. Este Abandoned Language é um exercício de pura integridade criativa, deixando de lado as guitarras eléctricas que, com eficácia variável, eram parte significativa do guião de trabalho anteriores, e trocando-as por armações de outras cordas (e até metais), ora melodicamente plácidas (com qualquer coisa de jazz de vanguarda nos saxofones), ora abeirando-se do psicadelismo (ou, em certos ápices, de uma saborosa "desorientação" tonal, cortesia das cacofonias do convidado Rob Swift, dos X-ecutioners). No fundo, o disco é uma das mais consistentes alavancas para o crescimento de uma cultura sonora de margem e certifica os Dälek como um dos sujeitos proeminentes (e imperdíveis!) dessa família.
sexta-feira, 23 de março de 2007
The Astroboy - A Derrota da Engrenagem
O homo sapiens vive, desde a génese do pensamento racional, uma decana disputa entre razão e emoção, com o paradoxo de, sendo o Homem o único animal dotado de raciocínio lógico e conclusivo, ele também dar corpo à mais indecisa das espécies. A invenção do computador, entre outras coisas, somou matemática à irresolução, tentando uma solução para o dilema ancestral. O primeiro disco do projecto The Astroboy (aka Luís Fernandes, guitarrista dos bracarenses Frequency) está conceptualmente envolvido nesta discussão, opondo o discurso desumanizado das engrenagens, leia-se o computador, à emoção tipicamente humana dos ambientes sonoros vagos e informes do pós-rock. De certa maneira, A Derrota da Engrenagem tenta o que outros ensaiaram antes, por isso repassando lugares visitados na iconografia de, por exemplo, Keith Fullerton Whitman, no apelo ao contraste entre sons de síntese e de música concreta (o ruído manipulado é uma matéria bem-vinda!), com os ritmos vintage da velhinha Roland TR606 e o discurso presente da guitarra eléctrica. No final, completamente mergulhados no fluxo hipnótico de sons, de torpor branco, já nem nos lembramos, em razão das diligências da emoção, da demanda primária desta navegação em espaço incerto e cai no esquecimento (ou convenientemente para lá é empurrada pela razão) a necessidade de uma resposta. Por fim, as notas aeriformes do álbum são apenas ensejo para prolongar o recontro de todas as indecisões para além do instante de desligar temporariamente o computador. E a solução existencial fica por achar.
Posto de escuta Descarregue o álbum no sítio da Test Tube
quinta-feira, 22 de março de 2007
RTX - Western Xterminator
Estranha sensação a de escutar a primeira faixa do alinhamento do segundo álbum dos RTX. Por momentos, somos levados a crer que Jennifer Herrema e seus pares encontraram um novo maná neste Western Xterminator, com rufos ecoantes e flautins em cadência lenta, à maneira de uma oração folk de psicadelismo pastoral. Mas, esgotados esses cinco minutos de surpresa, logo se franqueiam os acordes eléctricos do costume, a percussão assertiva e a voz mais conforme com os padrões clássicos do hard rock. E, então, se percebe que a gracinha dos RTX é apenas uma pantomima isolada, nada que belisque a subsistente máquina eléctrica dos RTX; em boa verdade, se a escrita de Herrema sobreviveu à deserção de Neil Hagerty, antigo parceiro dos Royal Trux, então não há criatura mortal (ou força cósmica) capaz de suster o frémito das suas ideias e, por consequência, de a arredar do estatuto de ídola régia do rock de que Courtney Love era herdeira natural. Nem que para isso seja necessário levar o som do grupo para um discurso claramente mais mainstream e que, à falta de melhor paralelo, busca coordenadas nos clichés instrumentais dos ZZ Top, Aerosmith (!) ou Guns n' Roses. Divertido e hedonista mas com pouquíssimo sumo. Ao menos a senhora tem melhores vocais do que Axl...
Sem comentários
Os utilizadores mais frequentes do apARTES terão notado que já não está disponível a hiperligação de comentários nas postagens. A verdade é que este blog foi alvo de um ataque de spam e, para levar a cabo a depuração dos artigos afectados e impedir a disseminação ao resto da base de dados, fui forçado a retirar o espaço de comentários, por tempo indeterminado. Em conformidade com isto, voltarei a disponibilizar a secção afectada, logo que possível. Até lá, qualquer mensagem pode ser remetida directamente para o endereço electrónico disponível na área de contactos.
O meu sincero agradecimento a todos aqueles que passam pelo apARTES.
O meu sincero agradecimento a todos aqueles que passam pelo apARTES.
quarta-feira, 21 de março de 2007
Springintgut - Park and Ride
Apesar de ser filho do seminal filão electrónico alemão e de já ter tocado com os conterrâneos F.S. Blumm e Mouse on Mars e com os americanos The Books, Andreas Otto é uma incógnita fora do seu país. Park and Ride é a segunda gravação que lança, a primeira ulterior à emigração para Amesterdão, e expõe um mosaico curioso de construções sintéticas, em exploração das possibilidades retóricas da electrónica minimalista. Trata-se, sobretudo, de um exercício espontâneo do mais artesanal e básico princípio da criação musical, a busca de melodias naturais e verosímeis, independentemente da sua fundamentação estrutural. Neste caso, as matérias são maquinais e provêm dos mais elementares caracteres do minimalismo, combinados com a erudição de um domador experimentado e engenhoso a sugerir, nos conflitos sónicos dos trechos, a dualidade do título. É como se, no mesmo universo (no disco e cá fora), existisse uma improvável camaradagem entre o torpor e quietude das introspecções (a pausa, o intervalo, o "park") e a euforia corrompida da urbanidade (a viagem, a lida, a "ride"). No final, essa ambivalência fecha o disco à austeridade e frieza típicas neste género de produtos, envolvendo-o numa saudável atmosfera de subjectividade. As aparições pontuais da guitarra de F.S. Blumm e dos vocais de Kazumi (na pérola "Precastor") são somente ornamentos colaterais desse saboroso princípio de incerteza.
terça-feira, 20 de março de 2007
Rodrigo Amado, Kent Kessler & Paal Nilssen-Love - Teatro
É sabido que do saxofonista Rodrigo Amado não deve esperar-se previsibilidade. Notabilizado por, em diversas ocasiões, optar pela especulação livre do improviso em detrimento da segurança de composições antecipadamente escritas, o músico reafirma essa tendência neste Teatro, ao lado do contrabaixo do americano Kent Kessler e da bateria do norueguês Paal Nielssen-Love, cúmplices usuais do seminal Ken Vandermark. As quatro peças aqui registadas são o resultado de uma sessão improvisada antes da actuação do trio, no festival Spectrum de 2004, no Teatro de S. João, no Porto. A ciência dominante, como não poderia deixar de ser, é o free jazz mais cru, sem arrebiques formais e subordinado a um discurso informe e assente unicamente na convocação dos mais puros instintos dos músicos e na interacção entre os fraseados de cada instrumento. A fórmula é, necessariamente, destemida, mais a mais sabendo-se que Amado e seus pares nunca haviam tocado em trio, mas a verdade é que a coisa dá bom resultado e impressionam a fluência sinérgica dos trechos e a sua feracidade estilística, ao jeito de exercícios íntegros de modernidade e alusão clássica. Sem voz líder, o disco consagra um trio em estado selvagem (no sentido mais libertário e criativo do termo) mas com identidade madura, provinda da conformidade de conceitos dos músicos, como se esta primeira vez juntos em trio, gravada para a posteridade, fosse afinal o epílogo de uma conivência antiga.
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segunda-feira, 19 de março de 2007
The Apples in Stereo - New Magnetic Wonder
Em condições normais, um disco com duas dúzias de faixas é um despautério. Porém, no caso dos Apples in Stereo, colectivo de Robert Schneider em silêncio há cerca de cinco anos, a proposta acaba por ser a réplica certa ao longo silêncio do músico que apenas conheceu intermissão com Expo, gravado há um par de anos sob o alter-ego Marbles. Retomado o percurso dos Apples, é reavido o andamento pop sessentista que prevalecia nos outros álbuns do colectivo, aqui com cores mais garridas, ainda que retendo as mesmas influências (um pouco mais abstractas e distantes) dos Beach Boys e dos Beatles. Ao mesmo tempo, as canções parecem fiéis a uma matriz criativa distinta, com outra propensão melódica e redutora (não castradora) dos abusos psicadélicos do passado. Em consequência, as texturas de sons de New Magnetic Wonder são mais imediatas, dir-se-ia que assumidamente mais pop multiusos, o que não deve ser tomado como sinónimo de cedências, antes como avivamento de substâncias que sempre estiveram na música dos Apples e que saem a ganhar da útil (e quase despercebida) protecção da electrónica. A mesma que, nos brevíssimos instantâneos que intercalam com as canções mais "convencionais", faz contraponto do conformismo teórico do disco e abre janelas para um escapismo conveniente, em ressaca da adocicada descarga de regozijo.
domingo, 18 de março de 2007
Andrew Bird - Armchair Apocrypha
Se bem que só tenha pulado do anonimato com Andrew Bird & The Mysterious Production of Eggs, de há dois anos, este senhor já por cá anda há mais de uma década e, volvido todo esse tempo, ainda reserva alguns trunfos na manga. Se bem que, no essencial, este Armchair Apocrypha não encerre argumentos muito diferentes do seu antecessor (ou dos demais álbuns), é perceptível uma tendência para ornar as canções com uma vibração rock um tanto mais substancial, pelo recurso a guitarras menos curtidas no estúdio e mais extrovertidas e eléctricas. A elas, juntam-se os imprescindíveis pizzicatos de violino e os assobios, companhias inseparáveis das melodias nostálgicas de Bird, que, mesmo tratando-se de matérias frequentes no cancioneiro do músico, sempre renovam a elegância, a ponto de sugerirem identidades novas. Devem-se, por isso, louvores à destreza de compositor de Andrew Bird e ao verosímil impulso para sonhar que mora nos vagares das melodias suspensas e de como, sem consentir adulterações, esse encanto se mantém mesmo quando se exprime na aparência de uma canção simples. Com o toque de Midas que já foi de Jeff Buckley.
sexta-feira, 16 de março de 2007
Panda Bear - Person Pitch
Ao que parece o rapaz encantou-se por Portugal e, segundo rezam as crónicas, comprou uma casinha na capital cá do burgo, para os lados do Bairro Alto. Foi lá que, aproveitando um hiato na actividade dos Animal Collective, o baterista do ensemble americano, Noah Lennox, gravou o mais recente produto do alter-ego artístico, Panda Bear. Person Pitch é, por isso mesmo, o desfecho de um processo de criação pessoal, mas esse individualismo, contrariando todas as teses conhecidas, não se cinge à introspecção, pelo menos na acepção mais egocêntrica da expressão. Pelo contrário, a música de Lennox, neste disco, desvenda um mundo sonoro peculiar, temperado com curiosidades técnicas de deliciosa extravagância (estupenda manipulação de samplers!) e alimentado pela bizarra verve do músico, afinal o reflexo imaginário de um denominador comum entre a matriz melódica do vanguardista Scott Walker e a comunidade vocal dos Beach Boys. E, de permeio, o experimentalismo com o ruído e as matérias de síntese ou o detalhismo na construção, não são menos do que arestas alternadas de um entendimento único de como fazer música jovial (bem açucarada) e tremendamente contagiante, com inovação, frescura de conceitos e credibilidade. Tudo numa série de canções do melhor que se ouviu neste ano.
Posto de escuta Sítio da Boomkat
quinta-feira, 15 de março de 2007
Do Make Say Think - You, You're a History in Rust
Está provado que coisa publicada com o selo Constellation não faz caso de convenções ou modelos. À editora canadiana importa, essencialmente, não o mercantilismo cego, mas firmar-se como delegação representativa de um segmento sonoro à margem das poderosas correntes comerciais e fiel a outros princípios. Foi com esse espírito que acolheram, há quase uma década, os conterrâneos Do Make Say Think. De então para cá, o ensemble tem erguido uma colecção de registos consistentes e, à quinta estância desse caminho evolutivo, já não há mistérios nem factos ocultos na sua música. Notícias novas deste You, You're a History in Rust são as primeiras incursões verbais da carreira dos DMST, cortesia esporádica dos vocais dos Akron/Family, acrescentados cautelosamente (quase como abstracções) às composições. Em tudo o mais, são conservadas as virtudes modelares do grupo: melodias errantes e densas, crescendos incertos das guitarras, as duas baterias em canais separados e uma atmosfera nostálgica e espacial. E, mais do que isso, o disco é testemunho de uma banda que, sem atalhar a inata complexidade do seu discurso, consegue o raro fito de convocar os nossos sentidos mais simples.
quarta-feira, 14 de março de 2007
Hipnótica - New Communities For Better Days
Repetindo a produção de Wolfgang Schloegl, dos austríacos Sofa Surfers, o quinteto lisboeta Hipnótica chega ao quarto fascículo do seu trajecto com o discernimento próprio de um colectivo que, volvida mais de uma década da sua génese, achou um nicho particular na música lusa. Depois de algumas oscilações (ou princípios de incerteza) estética, progressivamente afastados com o passar dos anos e a práxis de palcos e estúdios, a identidade sonora do grupo é, hoje, uma certeza com substância. Se, há três anos, Reconciliation fora jornada peremptória desse crescimento, confirmado recentemente na infalível ambivalência dos sons de Pele, fita de Fernando Vendrell, o corolário é exposto agora. Apresentando uma banda mais segura das valências de um registo sonoro que, tendo um híbrido trip-hop jazz como solução dominante, não descarta intersecções com outros ensinamentos, venham eles da electrónica mais imaterial (quase a chamar para a abstracção) ou de uma intuída proximidade com as escalas do rock experimentalista, New Communities For Better Days é o opus mais maduro dos Hipnótica. E o sentido de novas comunidades do título é levado à letra pelos lisboetas que, abrindo o estúdio a lucrativos auxílios de terceiros (de entre eles, sobressaem os metais de Abdul Moimême) somam cores virgens a uma proeza que deve reservar-lhes honras de figuração nos sumários best de fim de ano. Com justiça.
Posto de escuta Sítio Oficial
terça-feira, 13 de março de 2007
Shining - Grindstone
Side-project com alguns elementos dos escandinavos Jaga Jazzist, o conceito Shining mostrou, nos três discos anteriores a este Grindstone, ser um intrigante mutante. Com uma impressionante (e também saborosamente perturbadora) queda para desmontar qualquer noção preconcebida de música, os noruegueses atribuem-se um raro idioma sonoro, em longitudes díspares dos ambientes da casa-mãe. Sob este outro baptismo, a doutrina maior é o rock (progressivo, vanguardista ou voraz), não nos caracteres formais mais habituais, antes em exercícios de patrocínio de um art-jazz libertino, remendando-lhe os desvarios e corrigindo rotas. Nota-se uma propensão metal mais flamejante do que em anteriores trabalhos que, mesmo tendo as rédeas das texturas do disco, não atrapalha a interferência de outras forças dominadas pela banda, além do citado experimentalismo jazz, a abstracção electrónica - a luzir como cristais nos espaços negros do álbum - os arranjos barrocos - a lembrar as evasões de Bach - ou o canto lírico afiado. Acima de tudo, sobrevém um fenómeno raro: os contrastes ensaiados pelos Shining, se inicialmente ameaçam asfixiar o ouvinte em múltiplas contingências, acabam por refractar para um espaço comum, deixando no ar a excitação da cumplicidade.
LCD Soundsystem - Sound of Silver
Ainda sob os efeitos mediáticos da impressiva adesão dos públicos (e de um quinhão muito significativo da massa crítica) ao produto primeiro sob a sigla LCD Soundsystem, James Murphy e Tim Goldsworthy voltam a mostrar-se. Não chegou o fôlego a regular-se, depois da sessão aeróbica de 45:33, lançada no ano transacto, e já o par de músicos recicla os nutrientes sónicos da estreia, dando-nos nova dose da mesma sintaxe sonora que inteligentemente recolhia as modas recentes da dança (e dos incontáveis rótulos pós-qualquer coisa) na cena nova-iorquina - hoje por hoje, a grande maçã é um dos mais inventivos palcos da orbe musical - e as combinava com atenciosas memórias de outras ondas, sejam elas da síntese Kraftwerk ou dos ácidos de pista dos 80's. Sound of Silver é, assim, segunda pescaria num lago de ideias temporalmente extenso e, mesmo não vincando diferenças estruturais para o antecessor, revela uma certa refinação dos códigos LCD Soundsystem, rumo a um registo mais detalhista e que convive melhor com ocasos esporádicos da voz (efeito colateral de 45:33?). E com o desencanto irrequieto do rock. Porque música de dança com mais rock do que isto, não há.
segunda-feira, 12 de março de 2007
Arve Henriksen - Strjon
Depois da nobilíssima visão de um mundo a duas cores com que tão sublimemente nos tinha seduzido em Chiaroscuro, sugerindo, através das diversas mutações do seu trompete, uma espécie de maniqueísmo emocional, entre o silêncio (o escuro) e o som (o claro), o norueguês Arve Henriksen decidiu desenredar outra face do seu jazz de vanguarda. Fazendo-se acompanhar por Helge Sten, mais conhecido como Deathprod, companheiro nos Supersilent, o trompetista oferece-nos um vocabulário mais espacial, sendo menos notória a arquitectura de sobreposição de camadas de som do trabalho anterior. Desta vez, os estímulos instrumentais aparecem de forma esparsa, ao jeito de vozes isoladas casualmente em consonância e cuja emancipação (e respiração própria) é, afinal, a declaração conceptual do minimalismo na forma de Strjon. Curioso é perceber que, não obstante esse lastro minimalista que, em certos ápices é puxado ao limite, as composições seguram firmemente a densa musicalidade (e meditação) de Henriksen, mesmo que sem o esplendor prévio, graças à notável produção fastasmática de Sten.
Posto de escuta Sítio da Boomkat
Gui Boratto - Chromophobia
Apesar de o seu nome não ter sido ainda decifrado nos palanques do mainstream, o DJ paulista Gui Boratto tem atraído a deferência da imprensa alemã especializada em música electrónica. Chromophobia, primeiro álbum do brasileiro, prolonga os atributos que se ouviram em alguns singles do ano transacto, investindo na mesma receita house minimalista que, a despeito dos múltiplos desenvolvimentos estruturais das composições, não compromete o notável sentido de coesão do ópus. E se essa ligação sistémica entre os trechos podia, à partida, induzir alguma monotonia, a arte de Boratto introduz o pêndulo emocional certo: um tricotado complexo de sons divergentes, entre a euforia e o sinistro, algo que eleva os tons do disco a um estado de suspensão permanente e alguma opacidade. Absorvido nessa hipnose, o ouvinte é sujeito a exóticas construções de sons mecânicos (mas com denotação emocional), com crescendos cheios de acrobacias e algumas surpresas (a excelência do acompanhamento de guitarra, em "Xilo", e, logo a seguir, a única manifestação vocal do tomo, em "Beautiful Lie", são exemplos paradigmáticos). Com este leque de dons, Chromophobia experimenta a certeza de que do mínimo também se pode fazer magia.
sábado, 10 de março de 2007
Arcade Fire - Neon Bible
Quando estes canadianos mostraram ao mundo a primeira das suas criações, há dois anos, poucos não se renderam a uma estética que, sendo pop nas causas primárias, guardava distâncias saudáveis para os canais mainstream e, mais do que isso, depressa se tornou um novo paradigma do género, ao promover uma redefinição antológica da canção pop. Tamanha conquista, conseguida com o recurso a infalíveis medidas para dimensionar as melodias a um lirismo ímpar e à dose exacta de experimentalismo como saída de emergência de um caos controlado, deixou-lhes em mãos a complicada missão de escrever um segundo tomo de canções com a elevação do anterior. Neon Bible repete as noções, sempre em busca do hino pop de volume épico, e prova que o seu antecessor não foi apenas um feliz acaso. Mas, mais do que meramente repisar o trajecto de Funeral, o sucessor abre-se a outra extroversão, mostrando composições mais amplas, com arranjos eruditos, sendo "Intervention", gravada com a acústica especial do interior de uma igreja, exemplo categórico de uma certa majestade pop de que os Arcade Fire são figuras redentoras. E para levar a cabo essa incumbência messiânica, nada melhor do que uma bíblia de néon, cujo brilho se revela na forma de esplêndidas canções.
sexta-feira, 9 de março de 2007
Air - Pocket Symphony
Depois da aceitação quase universal de uma certa sacralização da electrónica plácida de J.B. Dunckel e Nicolas Godin, no seguimento do seminal debute com Moon Safari (1998), o peso mediático de cada edição dos franceses multiplicou-se exponencialmente. Na mesma medida, ao passo que se reproduziam inúmeros projectos de réplica dos Air (Kid Loco, Zero 7, St. Germain, Flunk, Sia ou Koushik, para citar alguns), com impressões variáveis, a dupla projectava gradualmente outros critérios, procurando arrumações diferentes para um som essencialmente voltado para o relaxe no sofá. A prudência contemplativa do anterior Talkie Walkie é coisa repisada no novo disco, quiçá reforçada, e isso é demonstração de um conformismo imprevisto, confirmado pela matriz estrutural do trabalho, sem sombra de mudanças drásticas em relação ao antecessor. Louva-se o recurso a instrumentos orientais que soma, em algumas peças de Pocket Symphony, uma alavanca instrumental útil mas que, mesmo com a aparição esporádica de Jarvis Cocker e Neil Hannon, não é suficiente para afastar o sabor generalizado a mediania.
!!! - Myth Takes
Eles tinham colhido os encómios da crítica com o álbum anterior, de há três anos, tornando-se uma espécie de líderes underground do movimento revivalista que o rock contemporâneo vem ensaiando, a várias vozes, nos anos mais recentes. Todavia, a reciclagem dos !!! nunca cedeu a copismos mais ou menos óbvios e, mesmo absorvendo porções espessas dos assuntos sonoros dos anos 70 (os Gang of Four como luminária maior), nunca perdeu de vista a definição de uma identidade própria. E, ao terceiro registo, a evolução desse processo identitário segue a propensão revelada antes, a mesma elegante predisposição para sentir melodias num espaço dividido entre o espasmo funk e as sucessões disco, nas mais variadas dimensões rítmicas. Myth Takes é, porém, diligente na busca de espaços comuns com outras sonoridades, fazendo mais pompa (e circunstância) da pronúncia dançante dos trechos, é certo, mas não se furtando ao contacto com as órbitas costumeiras de experimentação. Sólido, menos cerebral e mais físico do que os antecessores e, sobretudo, muito bem escrito, difícil mesmo será encontrar, este ano, um disco dance-punk mais viciante do que este.
quinta-feira, 8 de março de 2007
Grinderman - Grinderman
Demasiado remotas são as memórias de garagem de Nick Cave, do tempo em que ele e os compinchas dos The Birthday Party revolviam as entranhas mais negras do punk e expunham o seu lado mais corrosivo, em lentas e depressivas combustões. Volvidas mais de duas décadas do último acorde dessa trupe, Nick Cave é, hoje, um cinquentão ícone de outras andanças, apartadas dessa deflagrante rebeldia e vizinhas das órbitas mais melódicas da melancolia. Todavia, em Grinderman, fazendo-se rodear de companheiros dos Bad Seeds, ele parece querer recuperar o tal feixe de ideiais mais eléctricas dos Birthday Party, se não na crueza rústica (quase agressividade) típica de músicos rockeiros em génese - essa seria impossível de resgatar - pelo menos na predisposição para agarrar um som esteticamente mais solto e com pouco verniz de produção. Afinal, um código sonoro domado por Cave há uns largos anos atrás mas que, crivado pela poética contemporânea do músico (substância melancólica que, na maior parte dos trechos, avança sobre a tentada ousadia rock), não chega a ser igualmente impressivo. E a promessa eléctrica esfuma-se num alinhamento com Nick Cave a mais para ser baptizado de Grinderman.
quarta-feira, 7 de março de 2007
Mika - Life in Cartoon Motion
Ele é a mais recente sensação pop no Reino Unido. Nascido no Líbano, Mika Penniman subscreve uma fórmula musical simples, produzida deliberadamente para agradar às massas e que se socorre do cardápio completo de ingredientes de um blockbuster feito à medida: estruturas melódicas de chapa, refrões orelhudos e cores instrumentais garridas. A essas impressões, acresce uma assinatura vocal a enlaçar as memórias de Freddy Mercury e os falsetes de Jake Shears. No final, somadas as parcelas, Life in Cartoon Motion não é disco para tirar o planeta da órbita normal e, se como produto mercantil tem o sucesso garantido nas tabelas de vendas, não traz coisas especialmente novas, a despeito de uma ou outra ideia benigna e isolada. Todavia, na maior parte dos casos, esses factos felizes acabam convertidos em peças exageradas e que se enredam irremediavelmente nos seus próprios despautérios, encobrindo o mérito da semente original. E a pertinência pop de Mika. Sobreprodução ou propensão comercial, é pena que para fabricar uma réplica multiusos de Robbie Williams, se subjuguem às regras comerciais alguns esboços razoáveis de canções pop.
U-Clic - Console Pupils
O press release de lançamento do primeiro trabalho dos U-Clic não demora muito a situá-los entre dois marcos que, supostamente, são os extremos da extensa gama de influências dos nabantinos: Kraftwerk e Sonic Youth. Já se conheciam essas referências desde quando, há cerca de um par de anos, o projecto dava os primeiros passos em palco, num formato visualmente enriquecido pela projecção de vídeos, então se convertendo numa saborosa surpresa electrónica, com um espaço sónico povoado por algumas concessões ao punk. No entanto, pese embora a expectativa da edição discográfica, a demorada gestação do álbum e, pior ainda, as sucessivas protelações da sua publicação, acabaram por tornar Console Pupils algo anacrónico, não por insuficiência das composições, mas porque o contexto presente é díspar daquele que lhes deu origem. Além desse indisfarçável atraso face às preferências dos públicos, mesmo considerando que há nele matéria suficiente para validar o trabalho dos U-Clic, o disco não evita outra mácula. Entendida ou não como limitação de formato, a verdade é que, lembrando o trio nas outras dimensões além do áudio, a identidade registada no disco parece bem mais curta daquela que têm em cima do palco.
terça-feira, 6 de março de 2007
Tinariwen - Aman Iman
A música dos malianos Tinariwen é de uma simplicidade desarmante. A substância dominante é aquela mágica tradição serenateira dos antigos mercadores tuaregues que, com melodias da mais elementar pureza (e inocência) criativa, desviavam da mente as intempéries e a aridez das intermináveis travessias do Saara. Os Tinariwen fazem parte, ao jeito do saudoso Farka Touré, de uma nova tribo de poetas sonhadores e herdeiros da resistência dos caminhantes nómadas do deserto, com a mesma eloquência nos riffs singelos das cordas da guitarra, a que se juntam as vozes ululantes e desprendidas das cantadeiras de ocasião e as palmas festivas a arredar as agruras. Na generalidade, a mistura de ingredientes é semelhante à do par de discos já editados pelo septeto africano, mas Aman Iman é ainda mais espontâneo e cru, guardando a espiritualidade pagã e ousadia tribal da música africana, e incorporando-as no rock ocidental de cartilha. E música deste primor e credulidade, além de nos conquistar irremediavelmente, reporta-nos ao improvável concílio de duas fantasias geograficamente desunidas: a quintessência do rock e os ventos do deserto. Os Tinariwen são os cicerones da união.
Rjd2 - The Third Man
Depois de terminado o compromisso com o selo Def Jux, uma das primeiras confissões de Jon Krohn (aka Rjd2) remetia para a vontade do músico em redireccionar a sua música e embarcar numa rota pop. Ora, sabendo-se que os códigos pop não rimam especialmente bem com samples nem com electrónica de gueto, o produtor deixou de lado uma parte significativa da sua identidade, apostando, em The Third Man, numa orgânica instrumental menos sintética (com a excepção das batidas) e, outro facto novo, juntando vocais seus às composições. Além disso, a luminária hip hop, sempre presente nos trabalhos anteriores, foi igualmente dispensada, em favor de construções alinhadas com as essências pop mais convencionais e, por inerência, menos flexíveis. Tal perda de elasticidade é empolada pelo registo vocal que, ao somar um espectro tonal estreito, acaba por reduzir a eficácia das melodias, excepção feita à oportunidade de "Beyond the Beyond". O saldo final, ponderados os óbices e as virtudes do disco, suscita uma reflexão: Rjd2 continua a ser, mesmo com um ou outro exagero, um malabarista de sons de escol. E o novo tomo é uma simpática colecção de vestígios para um acontecimento maior que ele terá na forja.
sábado, 3 de março de 2007
Explosions in the Sky - All of a Sudden I Miss Everyone
Apesar da suposta liberdade conceptual adstricta à noção primeira de pós-rock, a verdade é que o género se deixou envolver por alguma inércia criativa, muito por culpa da banalização (e posterior cristalização) dos princípios que estiveram na base da sua afirmação. O último registo dos Explosions in the Sky, um dos mais estimados representantes do género, vem revalidar essa hipótese. Embora optando por uma estética mais simples e, consequentemente, menos contígua do paradigma habitual, não há nada em All of a Sudden I Miss Everyone que os texanos não tenham experimentado antes. Distorções (menos frequentes), alternâncias de tempo, arritmias, guitarra, baixo e bateria continuam a ser as matérias do código sonoro dos Explosions in the Sky, sujeitas à formatação do costume. Sem sequer contemplar o esboço de um rasgo desviante desse trilho, o disco torna-se, necessariamente, formulista e previsível e daí derivam duas ilações. Os seguidores indefectíveis da banda, não verão sombra de pecadilho no decalque de ideias e render-se-ão incondicionalmente; os adeptos da reciclagem de conceitos, provavelmente darão uma chance ao disco mas vão deixá-lo cair rapidamente.
Mira Calix - Eyes Set Against the Sun
Passados sete anos da estreia em disco, a sul-africana (radicada no Reino Unido) Chantal Passamonte persegue um ideário musical semelhante ao começo de carreira, embora o apresente com um invólucro sonoro diferente e mais ambicioso. É exactamente essa particularidade que sobressai no terceiro registo assinado como Mira Calix. Em concreto, as fundações de Eyes Against the Sun têm o mesmíssimo pressuposto meditacional, fazendo uso de um posicionamento minimalista e hesitante de sons e silêncios e do vanguardismo característico da sua música, assente essencialmente numa mistura circular de três ingredientes: sons naturais (ao jeito da musique concrète), instrumentalizações clássicas e vozes processadas. Mais melódico do que os antecessores, o disco faz-se menos frio e técnico, por força de um investimento inferior nas beats experimentais, em favor dos arranjos da London Sinfonietta e da assimilação mais conveniente dos vocais. No final, não sendo um disco de soluções convencionais, nem de canções em sentido estrito, e apostando numa produção que lhe salienta a pronúncia rústica e fragmentária, pode tornar-se uma experiência auditiva estranha para aqueles que buscam sensações imediatas.
Posto de escuta MySpace de Mira Calix
sexta-feira, 2 de março de 2007
Patrick Wolf - The Magic Position
Não era difícil prever que, depois do panegírico (justo) que a crítica especializada consagrou a Wind in the Wires, publicado há um par de anos, o jovem Patrick Wolf fosse à procura de uma coisa maior. Em boa verdade, o curso ascendente da sua música faria supor essa intenção, se mais não fosse, ao menos pelo seu conhecido padrão de auto-exigência. E os resultados dessa depuração recorrente permitiram-lhe a rara veleidade de chegar, em apenas três álbuns, ao mais maturado dos estados da pop, em que o som toca a sumptuosidade dos clássicos, em vários registos, mantendo distâncias para a tentação do mainstream. É, afinal, essa a grande vitória deste The Magic Position, a fuga inteligentíssima aos lugares comuns e à incipiência das soluções orelhudas e, a despeito disso, a conservação de um certo imediatismo, segurado na arrumação melódica do disco, nos magníficos arranjos - as cordas são o pêndulo tragicómico - e numa produção que aprecia cortes modernos, de talhe electrónico. E sair dessa missão ordenadora com um opus que repassa cuidadosamente todos os elementos essenciais a um disco pop da mais virtuosa casta, é obra!
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