terça-feira, 26 de agosto de 2008

Weezer - Red Album

6/10
DGC
Interscope
2008
www.weezer.com



Apesar da idealização quase instantânea que mereceram junto da comunidade melómana desde os primeiros trabalhos editados, os californianos Weezer experimentaram a hesitação própria de uma banda pouco preparada para o êxito. Depois de um par de álbuns chegarem ao mercado (Weezer, de 1994, e Pinkerton, o auto-renegado disco de 1996) e os consagrarem como um dos valores emergentes do rock alternativo americano, Rivers Cuomo e seus pares cessaram actividades, não só pelos inúmeros episódios de cisão no interior da banda, mas sobretudo pela insatisfação com o rumo trilhado até esse momento. Pinkerton e o arrependimento público da banda em tê-lo feito - o que acabou por atribuir ao disco, mais tarde, um estatuto de culto -, foi a derradeira lesão num colectivo a mãos com o ónus do mediatismo. A falsa partida dos Weezer deixara, contudo, a semente de um fenómeno de culto que, além de não perecer com o termo anunciado da banda, acabou por motivar uma expressiva onda de expectativas quanto a um regresso. Ele aconteceria quatro anos mais tarde, trazendo a banda a um som mais voltado para grandes arenas, sem abandonar a genética geek de pós-grunge descomprometido que, tanto gráfica como musicalmente, fora substrato essencial dos primeiros discos. A escrita de Rivers Cuomo mostrava-se consistente e a sua trupe retomava, com uma passada mais firme, o percurso interrompido sem aviso. A Green Album (2001), tido como um dos registos mais sólidos da discografia Weezer, seguiu-se Maladroit (2002), um vibrante exercício de aproximação ao lado mais "pesado" do rock melódico. Canções pop, servidas a guitarra eléctrica volumosa e com refrões orelhudos, eis a fórmula da segunda pele dos Weezer.

Depois de um pouco inspirado Make Believe (2005), a banda retoma a estratégia dos álbuns homónimos - depois diferenciados por terceiros em função da cor dominante da capa - para reafirmar-se. O formalismo pop não está em questão, ele é a matéria de subsistência da banda, mas até visualmente - vide a capa do disco - os Weezer parecem levar-se menos a sério. No lugar do fidelíssimo aspecto nerd de outrora, aparecem agora, em manifesta imbecilização do estatuto de estrela, quatro figurões de universos contrastantes, do hippie de última geração (a lembrar Devendra Banhart), ao engravatado republicano, ao cowboy bigodado de meia-idade e ao descontraído rock star. Mas mais do que a aparente desordem na indumentária, o disco também revela confusões estéticas pouco habituais nos Weezer. Atrás da idiossincrática harmonia de Cuomo - que, também aqui, produz óptimos momentos ("Troublemaker" ou "Pork and Beans", por exemplo) -, mora alguma irresolução entre a majestade rock e registos mais intimistas. Nenhum mal em exibir um lado mais introspectivo (que nem é totalmente novo), mas ao fazê-lo os Weezer arriscam um quinhão significativo de si mesmos. E a caricatura final, transformada em música, pode ficar tão irrisória (e ambígua) quanto a capa do álbum. O que, inevitavelmente, ofusca as (poucas) boas ideias.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Ry Cooder - I, Flathead

6/10
Nonesuch
Warner
2008


Reconhecido como um guitarrista do escol americano contemporâneo e um dos compositores mais inventivos da Califórnia, Ryland Cooder é também um dos mais acérrimos defensores do tradicionalismo. Nesse sentido, ele é um dos icónicos intérpretes dos sons herdados da história da música americana, mormente das heranças magnas do country poeirento e da folk envelhecida de Johnny Cash, de Pete Seeger ou de Bob Dylan. É nessa ramada genealógica que, como outros trabalhos da discografia de Cooder, se inscreve este I, Flathead (deliciosa referência travestida ao universo de Isaac Asimov...), assinado pelo alter-ego Kash Buk. Ao lado dessa identidade manifestamente "americana", o californiano deu-nos alguns belíssimos exercícios isolados de difusão da música do mundo - que, entre outros, mostraram ao mundo o indiano VM Bhatt, o cubano Manuel Galbán ou o malogrado maliano Ali Farka Touré -, então revelando ânimos exploradores que, paulatinamente, se foram alastrando às suas criações mais tradicionais. A trilogia agora encerrada com este disco, dedicada à California, é uma evidência dessas contaminações estéticas e também de um activismo sócio-político vivo, sinónimo de uma mente musical desperta para o mundo além da música. Em todo o caso, a despeito da competência do costume, I, Flathead soma pouco à extensa discografia de Cooder. Com uma ou outra excepção pontual, as canções refugiam-se tecnicamente nas zonas de conforto que o músico domina, sugerindo, ainda assim, uma viagem imaginativa (e escrita no booklet) de Kash Buk - ao som de honky tonks e boogies -, pela multiplicidade étnica e marginal da California e seus símbolos, os nipo-americanos, os nativos, os latinos e um surrealista mecânico extra-terrestre. A música não acompanha a diversidade simbólica e o exotismo da narrativa escrita, mas não deixa de contemplar momentos de sabor fino, a situar definitivamente a música de Cooder no habitat natural. E isso é, em quaisquer circunstâncias, um facto bem-vindo.

Posto de escuta Steel Guitar Heaven|Pink-O Boogie |Filipino Dancehall Girl

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Um peixe com asas para voar...

Já a rodar com o devido destaque nas rádios nacionais mais atentas ao fenómeno da música menos comercial feita cá no burgo, o novo single dos bracarenses Peixe:Avião conhece agora manifestação em vídeo. Chama-se "O Arame é uma Espera" e é o cartão de visita da estreia em disco de uma das mais suculentas revelações das safras contemporâneas da criação musical nacional. O álbum chega aos escaparates a 15 de Setembro, com a chancela da Rastilho. Fica aí o vídeo...

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Lindstrøm - Where You Go I Go Too

7/10
Smalltown Supertown
2008
www.myspace.com/
feedelity



Nos tempos que correm, o produto musical é um activo de formas cada vez menos padronizadas. O advento da era digital criou não apenas outros mecanismos veiculares de divulgação (com o MySpace à cabeça), mas também suscitou, por arrastamento, um interesse renovado nos formatos mais curtos (os 12" ou o EP, por exemplo). No orbe electrónico, essa evolução - e a consequente depreciação do conceito de álbum - assume contornos paradigmáticos. A discografia do norueguês Hans-Peter Lindstrøm é espelho disso mesmo, com inúmeras edições avulsas nos tais formatos curtos e outros tantos remixes desde 2003. Volvidos três anos do início de percurso, e depois do impacto mediático do trabalho conjunto com Prins Thomas (esse sim, em formato CD e LP), a conterrânea Smalltown Supersound seleccionou e compilou alguns trechos do numeroso histórico de Lindstrøm, no aclamado It's a Feedelity Affair (2006). Na prática, o tomo, mesmo sendo uma colecção de composições já editadas, constituiu o primeiro "álbum" do músico escandinavo, então exibindo ao mundo a dimensão quase épica de uma electrónica espacial, erguida numa orgânica de sintetizadores astrais e subliminarmente distante das fragrâncias sonoras divididas com Prins Thomas. Daí para cá, além da inscrição do seu nome na colecção de DJ sets Late Night Tales e do segundo capítulo com Thomas, Lindstrøm prosseguiu a disseminação do seu trabalho em edições soltas e remixes, até chegar a este Where You Go I Go Too.

Naquele que é, de facto, o seu primeiro álbum autoral, a escolha de um escalonamento tríptico, em cinquenta e cinco minutos, não deixa de ser sintoma de que Lindstrøm não gosta de alinhamentos com muitas faixas. Seja isso uma deformação técnica oriunda da habituação ao formato EP ou uma mera opção conceptual (ou estética), não deixa de ser arriscado, para um músico habituado a trechos de curta duração, esticar as suas composições no tempo (o tema-título tem quase meia hora!). Em todo o caso, o novo opus de Lindstrøm desvenda uma curiosa mutação da space disco que lhe corre nas veias, destapando uma afinidade desconhecida por estruturas progressivas, onde as mudanças rítmicas e a reinvenção são premissas fundamentais para reter o interesse do ouvinte nas melodias repetitivas e extensas. Das três peças, a mais conforme com o património Lindstrøm é a primeira - que dá o nome ao álbum. Curiosamente, é também a mais plana e previsível do trio e, mesmo que bem construída numa compassada (e psicadélica) escalada disco, tem poucas variações para se manter apelativa por tanto tempo. Segue-se "Grand Ideas", revisão de uma composição conjunta com Prins Thomas que, sem esse nome, figurou no alinhamento de um mix feito pela dupla para a BBC. Mais colorida e objectiva, a composição é um produto dinâmico e consequente, entre melodia e especulação rítmica, minimalismo e euforia. O disco fecha com o seu momento mais alto, "The Long Way Home", uma preciosidade de execução a lembrar o kraut rock, a derivar para as contemplações da electrónica left field e para o lounge, com o indispensável devaneio cósmico próprio de Lindstrøm. Não é um álbum de consumo imediato, nem de aceitação genérica; não se resume sequer à tipificação habitual de Lindstrøm. Mas, atrás do aparente excesso na extensão das faixas, mora afinal um disco suculento e, mesmo que de uma forma mais abstracta do que é costume em Lindstrøm, verdadeiramente gratificante.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Daedelus - Love To Make Music To

7/10
Ninja Tune
2008
www.ninjatune.net



O californiano Alfred Darlington é um académico da música que, depois do adestramento nas liberdades estéticas do jazz, se perdeu de amores pela descoberta da miríade de possibilidades criativas da electrónica e dos samplers. Como produtor ou como autor (com a assinatura Daedelus, desde 2001), em inúmeros selos e projectos musicais e colaborações com terceiros, foi paulatinamente erguendo um património musical conotado, na essência, com o orbe IDM, mas igualmente versado em padrões mais dançáveis da electrónica e, sobretudo, fiéis a uma verve cultora de várias influências da música negra (leia-se soul, funk ou hip hop). Esse traço pouco convencional (e de raro eclectismo) da música de Daedelus é uma das regras deste Love To Make Music To, o primeiro do músico pela Ninja Tune e, como noutros inquilinos do selo londrino, desvenda uma abordagem atípica, quase subversiva e sempre a extrapolar, os códigos sonoros do hip hop. Contudo, a atmosfera do disco não se fecha aí, antes usa essa referência como ponto cardeal de arranque e orientação da construção (ou sobreposição, ou colagem) de texturas muito concentradas, por vezes em eufórica proximidade do caos, e em que o garbo dos Coldcut vem constantemente à memória. E entre flutuações rítmicas, vozes convidadas, variações de beats e mudanças de estilo, Love To Make Music To revela-se uma obra com raro sentido de oportunidade, mormente na exploração de convergências entre a música electrónica e numerosos universos colaterais. A sugestão resulta numa linguagem que, tropeçando pontualmente na previsibilidade das estéticas nocturnas, dela se distancia pelo recurso equilibradíssimo a mutações nos ritmos e melodias. Se pecadilho houver de apontar-se a Love To Make Music To, ele reside na extensão do disco: cinquenta e cinco minutos. É muito tempo para mostrar música que, por ser tão densa em pormenores e, portanto, por implicar visitas concentradas, ganharia com um alinhamento mais contido. Em todo o caso, o novo Daedelus é, sem reservas, um dos mais refrescantes exercícios que a electrónica de colagens teve nos últimos tempos.

Posto de escuta MySpace

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Oneida - Preteen Weaponry

7/10
Jagjaguwar
2008
www.enemyhogs.com



Embora mais intuída do que ostensivamente manipulada nas composições ou assumida como fogo dominante, a afinidade do trio nova-iorquino Oneida pelas flamas utopistas do rock progressivo foi sempre uma matéria presente na sua discografia, ao lado do impressivo espírito de transgressão que atravessa uma identidade musical pautada pela liberdade estética. Depois de um octeto de álbuns em que apontaram propósitos estilísticos para a especulação noise em volta de um bizarro ideário de canção - o que lhes valeu, com onerosa responsabilidade, a entronização como anarquistas maiores das novas (e injustamente ignotas) safras americanas -, é chegado o momento de nova centragem, de pesar prós e contras de um percurso de consciente evolução, do primitivismo tímido da garagem para a esquizofrénica deflagração em palco. Não é estranho, portanto, que num introspectivo exercício de escrutínio das forças vivas (na criatividade) no seio do trio de Brooklyn, Kid Millions, Bobby Matador e Baby Hanoi Jane tenham encontrado um original prazer na musicalidade menos formal. Afinal, as energias improvisadas são um amor antigo que, por força das circunstâncias editoriais ou dos gostos do momento, foi sendo castrado (ou limado) em disco, mas nunca deixou de alimentar-lhes o ego nas actuações ao vivo. O registo dessa facção libertária da música dos Oneida impunha-se e, para esse efeito, nada melhor que um tríptico conceptual de discos sem qualquer tipo de atilho estrutural ou formatação predefinida. A série, sugestivamente baptizada "Thank Your Parents", conhece agora o momento inaugural - será continuada em Janeiro de 2009, com Rated O - com este Preteen Weaponry, álbum essencialmente instrumental, também ele dividido em três partes.

A tríade abre com um trecho de pura inventividade rítmica, substancialmente notada na (brilhante) incontinência da percussão de Kid Millions. Com um hipnótico e perturbador tecido sónico de fundo, algures entre o noise, o mantra instrumental de feitiçaria negra e a perversão melódica (chega a lembrar os Doors), é a bateria de Kid Millions - nervosa, derivativa, sempre consequente - que dita regras. Na segunda faixa, descansa a bateria em cadências mais "pacíficas" e crescem os efeitos sujos da guitarra, num fantasmático (e repetitivo) bailado de espectros, com o efeito atmosférico digno de uma peça progressiva, mas aquém da exigível inventividade. A dialéctica fecha-se, na terceira parte, num discurso agitado de ritmos espasmódicos, bem ao jeito de um número de improviso, misturando fantasias de guitarras e teclas; coisa para soltar, com a incerteza devida, o acto não premeditado de criação musical. E Preteen Weaponry, com as incongruências e falhas próprias de uma cerimónia repentista, é isso: um produto sem preconceito e sem regime. Como os Oneida, de resto.

Posto de escuta Sítio da Jagjaguwar

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Buffalo Killers - Let it Ride

7/10
Alive Records
2008
www.buffalokillers.com



De cada vez que surge um projecto musical alinhado com uma determinada corrente estética de revivalismo, se percebe com mais propriedade que arte e nostalgia são conceitos que, quando convergem, nos dão, com o reacendimento de memórias, a dimensão mais precisa do conceito de "clássico". O segundo disco do trio Buffalo Killers, de Cincinatti, é uma achega preciosa para essa discussão, por reportar reverencialmente à luminária do rock psicadélico dos 70's, num derivado mais contido (e por isso mais preciso) daquilo que, por exemplo, os Wolfmother fizeram recentemente. Se os australianos pecaram, nesse processo de revigoração, pelo excesso de pastiche do ideário Led Zeppelin, assim se expondo à não concretização de uma identidade própria, os Buffalo Killers fazem mais do que um mero tributo e, movendo-se no mesmo padrão estético, mostram competência para se emanciparam de um plano de referências que vai de Neil Young a David Bowie, de Rolling Stones a Allman Brothers, de Greenhornes a Black Sabbath, de Lynyrd Skynyrd a Peter Frampton. E, nesse ilustre novelo, cabe ainda uma ponta - a mais relevante - para a escrita descontraída e versátil dos BK, assente sobretudo nos riffs de guitarras (ora inflamadas, ora plácidas), na gravidade do baixo, na diligência da percussão e na expressividade vocal. Podem não ser a next big thing, nem sequer um facto absolutamente original, mas os Buffalo Killers certamente são parte da elite revivalista do rock "clássico". E Let it Ride é um bom apontamento para reescrever a história.

Posto de escuta MySpace

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Brazilian Girls - NYC




Embora este seja já o terceiro registo dos Brazilian Girls, são poucos os que tiveram oportunidade de saborear devidamente um dos melhores conceitos de música de fusão da corrente cena nova-iorquina. Os argumentos do agora trio americano - depois da saída de Jesse Murphy - fazem, sobre uma base estrutural de cariz electrónico, uma equilibradíssima reprodução do mosaico cultural e da amálgama sonora que é, hoje, a Grande Maçã, com derivações estéticas entre a pop, o jazz, a bossa nova (num prisma vanguardista) e quaisquer devaneios rítmicos mais dançantes. A essa mescla junta-se uma das vozes de maior carisma (e elasticidade) da actualidade, a da italiana Sabina Sciubba, a desdobrar-se em diferentes tons e idiomas - a moça desembaraça-se muito bem em inglês, francês, espanhol, italiano e alemão. Como os antecessores, NYC presta tributo a uma curiosíssima experimentação textural, num código musical que fica no limite da subversão melódica e que, não fossem as harmonias vocais de Sciubba, impeliria o ouvinte para os domínios da música de decifração custosa. E, embora o pareça, não é esse o caso aqui. Atrás do volumoso arsenal de percussões pouco "pacíficas", mesmo das alucinantes misturas químicas da electrónica, mora um romantismo subtil, um intimismo pouco comum neste tipo de produtos e um conceito firme de canção pop. Dir-se-ia, em abono da verdade, que o novo disco dos Brazilian Girls é um filho do cosmopolitismo contemporâneo e da transversalidade cultural cada vez mais em voga. E isso faz-se pesando, com a mesma respeitosa obediência, paladares de sofisticação retrógrada, um gosto ecléctico e uma verve voltada para a especulação vanguardista. É por isso que NYC, com evidente crescimento no capítulo da composição, mostra música de identidade ambivalente, de muitas eras e modas, de muitas escolas e ensinamentos mas, acima de tudo, entusiástica e moderna. E sem poiso estético (ou geográfico) fixo. O que é o mesmo que dizer que os Brazilian Girls, sendo genuinamente contaminados pelas miscelâneas sonoras de Nova Iorque, podiam inscrever-se nas novas turbas da world music. O título nem lhes ficaria nada mal...

Posto de escuta Amazon

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Conor Oberst - Conor Oberst

7/10
Merge Records
PopStock
2008
www.conoroberst.com



A ideia de assinar este disco com o nome de baptismo, ao invés do mais costumeiro e mediático epíteto de Bright Eyes, tem uma razão. O conceito Bright Eyes, uma das marcas mais significativas da moderna folk americana, assentou, nos últimos anos, em dois pilares fundamentais: o próprio Oberst e Mike Mogis, o instrumentista/produtor braço direito do músico/compositor do Nebraska na caminhada pelo orbe da música. E este, além de ser o primeiro registo sem Mogis, em cerca de uma década - pelo que faria menos sentido integrá-lo na discografia Bright Eyes -, é também o contributo mais pessoal de Oberst para o cancioneiro americano. Nesse sentido, pode presumir-se que, além da evidência do afastamento do parceiro de longa data, reside nestas canções a definitiva imposição de Oberst contra o incómodo (e injusto) rótulo de prodígio adolescente que lhe colam desde os doze anos. Atrás do enfatizado (pelos media do seu país) despautério de algumas aparições provocatórias em festivais americanos, inclusivamente marcadas por algum pretensiosismo ideológico pouco tragável, Oberst sempre foi um músico prolífico, talentoso e de verve genuína. Foi assim que, sem brusquidão, ergueu os Bright Eyes a um lugar raro na folk moderna, com uma identidade perdida entre a melancolia e a ansiedade ou o místico e a crítica. Ao mesmo tempo, aceitando o sustento das mais ancestrais raízes da música do seu país, Oberst foi capaz de construir um património musical carismático como poucos. E é neste Conor Oberst que a sua personalidade musical se mostra mais crua (leia-se "acústica"), apartada das cosméticas sinfónicas dos Bright Eyes.

O investimento nos arranjos é mais comedido, o que ajuda a situar as canções de Oberst num plano entre o protesto iluminado de um Dylan (outro dos rótulos com que Oberst tem lidado) e o melodismo rock de alguns momentos de Elvis Costello, além das inevitáveis referências a Neil Young, Tom Petty ou Ryan Adams. E claramente distante dos desmandos instrumentais do pseudo-orquestral Cassadaga. Aqui, as canções respiram a mais confortável das intimidades - ou intimismo melódico - e são servidas por uma lírica mais consciente do que antes, em volta de assuntos tão concretos quanto a inevitabilidade da morte, a escapatória das drogas e, claro, as paixões feitas desamores. E nenhum outro opus de Oberst tem este charme e credulidade, esta maturidade no acto de criação e esta consistência; e estes, por serem factos inesperados, tornam-se tanto mais interessantes.

Posto de escuta MySpace