terça-feira, 24 de março de 2015

Lightning Bolt - Fantasy Empire


8,2/10
Thrill Jockey, 2015

Os Lightning Bolt são um verdadeiro case study de como um produto musical de nicho pode desafiar o seu confinamento estético "de origem" e chegar a públicos e palcos díspares. Alguma razão há-de haver para a improvável longevidade (de quase uma vintena de anos) e reconhecimento do noise agudo de Brian Chippendale e Brian Gibson. É deles um quinhão importantíssimo da visibilidade que o género ganhou nos circuitos mediáticos, em razão de uma discografia consistente e definidora e, talvez até mais do que isso, dos lunáticos assaltos sónicos que o duo promove em palco (ou no meio do público, como acontece amiúde). Seja como for, os Lightning Bolt são uma força para não ser ignorada; goste-se ou não do radicalismo do género, há uma aura triunfalista na música deles que mexe com o mais empedernido dos resistentes. Se, depois, se é convertido ao estilo ou não, é outra conversa, mas essa curiosidade primária fica e é precisamente por ela que os Lightning Bolt se tornaram aquilo que são hoje. Musicalmente, a coisa é simples: volumes bem amplificados, a bateria furiosa de Chippendale e o baixo musculado de Gibson, sem ornatos ou enfeites, sem manipulação, apenas electricidade, urgência e implosão de ruídos crus.

No primeiro álbum pela ecléctica Thrill Jockey, e o sétimo do percurso, o bombardeio impiedoso da dupla segue sem cedências de qualquer ordem, embora se perceba que é o seu registo mais cuidado na produção e no detalhe e definição das texturas. Nesse particular, Fantasy Empire converge com os momentos mais inspirados dos LB, o que nem é de estranhar dada a longuíssima gestação de seis anos - hiato que também serviu para Chippendale se aventurar a solo como Black Pus - e as sucessivas depurações que adiaram o lançamento. No final, o disco é tão insanamente inspirado, tão delirantemente elástico e áspero como se esperava. Afinal, seis anos sem uma sova maníaco-agressiva aos tímpanos não pediam menos do que isto.

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sábado, 21 de março de 2015

Afonso Pais - Terra Concreta

7,1/10
2015

Foi o background formativo firmado nos domínios do jazz que fez de Afonso Pais um admirador do improviso e da espontaneidade que lhe está ligada. Também por isso, a sua música se tem afirmado - e o próprio autor sublinha o facto - como uma colecção de impulsos, o reflexo dos mais elementares (e naturais) ímpetos de criação, sem o espartilho de formas e tempos. Em certo sentido, o processo artístico do guitarrista tem sido uma busca muito auto-consciente dos trilhos menos óbvios (ou menos imediatos) que ligam um qualquer elemento inspirador, necessariamente vago e abstracto, à sua concretização, depois, na forma de uma composição terminada. O método que leva a essa transformação lida com possibilidades infinitas de tom, de tempo, de espaço, de matérias envolventes que, afinal, alimentam as escolhas do acto de criação musical em si. E é precisamente o reconhecimento dessa teia de relações entre artífice, estímulos e ambiente e da influência incontornável destes sobre aquele que nasce esta Terra Concreta. O disco é um documento musical que regista, sem a ingerência exagerada da edição a posteriori, uma compilação de trechos gravados fora de estúdio, em pleno ambiente natural, com recurso exclusivo a instrumentos acústicos e aceitando a interferência da panóplia de sons do mundo selvagem. A particularidade de cada trecho ser absolutamente irrepetível, pela própria circunstância da gravação dos sons envolventes, confere-lhe uma aura única.

Terra Concreta tem que ser visto como um interessantíssimo ensaio de simbioses entre criação musical e natureza. Não sendo, em essência, um trabalho experimentalista na composição - porque não funde efectivamente os sons naturais na matriz construtiva das peças (como na "verdadeira" musique concrète), antes os apresenta como conteúdo "cénico" - há aqui material suficiente para ter vislumbres de como funciona a inspiração "naturista" de Afonso Pais. A natureza está antes, a ideia mistura-se com ela e nasce o esboço que se faz canção. Abra-se o silêncio e escutem-se, pois então, essas canções na natureza.

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quarta-feira, 18 de março de 2015

Six Organs of Admittance - Hexadic

7,8/10
Drag City, 2015

Ben Chasny não tem um poiso estético definido, é um errante compulsivo e isso é particularmente notório no seu projecto musical a solo, quase a completar uma recheada década de edições dedicadas a especular sobre as possibilidades sonoras que podem começar nas cordas de uma guitarra. Aparte as suas colaborações regulares em colectivos do etiquetado movimento da New Weird America (a nova folk psicadélica), encabeçado mediaticamente pelo seu amigo Devendra Banhart, o guitarrista fez do conceito Six Organs of Admittance a sua sala de ensaios, em que a liberdade do trabalho individual lhe permite mostrar uma face mais efervescente da sua verve. Nesse espaço criativo, a canção enquanto objecto estruturado é secundária; o que importa é ir atrás de uma ideia e construir qualquer coisa em cima dela, sem formatações ou preconceitos. É também por isso que, na discografia Six Organs of Admittance, não existe sequer uma intenção de continuidade de álbum para álbum, antes o propósito de testar os limites de um instrumento enquanto produtor de sons. Em certo sentido, a obra de Chasny acaba por ser um desembaraçado exercício de musicologia da guitarra e, nesse particular, é um sucesso retumbante a que só o tempo virá a fazer justiça. Com mais ou menos electricidade, com registo vocal ou não, entre a música tradicional e o psicadelismo, entre blues e experimentalismo, com a ajuda pontual de percussão ou de orgãos, Chasny encontrou sempre matéria-prima para a sua demanda.

Hexadic põe termo a um hiato de três anos sem novas gravações e parte das derivações eléctricas inauguradas no antecessor Ascent (2011), levando-as a um extremismo novo no universo Chasny, sobretudo pelo enfoque inopinado na distorção. O resultado é uma implacável - talvez demais para os seguidores habituais de Six Organs of Admittance - e intrincada escalada sónica que desbrava terreno virgem na discografia de Chasny, sem contemplações e bem ao jeito (sem o ser) de uma lunática jam de improviso. Pode não ser o disco mais original do mundo, mas é mais uma oportuníssima achega ao cardápio de invenções de Six Organs of Admittance. Mas fica o aviso: apesar dos pedaços mais contemplativos, que também os há, Hexadic não é para tímpanos frágeis.

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Ibeyi - Ibeyi

7,3/10
XL Recordings, 2015

Filhas do percussionista Anga Díaz, falecido em 2006 e reconhecido membro do colectivo Buena Vista Social Club que levou a música cubana aos quatro cantos do globo, as gémeas Lisa-Kaindé e Naomi nasceram num ambiente musical riquíssimo em influências. Além do atavismo Yoruba que lhes é atribuído - e que está até no nome artístico que escolheram (traduz a divindade das gémeas, ao que parece) - e da proximidade sanguínea com a herança cultural latina dos progenitores (a mãe é a cantora franco-venezuelana Maya Dagnino), residem e foram criadas em Paris. No cosmopolitismo da capital francesa, encontraram nas matizes electrónicas o complemento de modernidade que une todas essas referências e dá sentido contemporâneo à espiritualidade orishá que lhes corre nas veias. Também por isso, o homónimo disco de estreia é coerente: encontra intimidades interessantes entre realidades musicais temporal e geograficamente distantes. O cajón e os tambores batá não podiam deixar de ser transversais aos ambientes emocionais do disco, ou não fossem ferramentas predilectas de Naomi na estruturação minimalista das canções que, depois, crescem com o piano esparso da irmã e demais avulsas aparições.

Em todo o caso, é efectivamente de minimalismo que é feito o disco,  umas vezes na mais óbvia tradução de uma espécie de ritual ou oração tribalista, outras vezes tão hipnótico como a mais pura peça de música urbana moderna (James Blake e Frank Ocean são luminárias confessadas pelas próprias) e sempre ancorado numa lógica percussiva muito equilibrada. Ainda assim, o feitiço ressonante das manas Díaz, esta encantadora mestiçagem entre pop moderna, ritmos de cuba e do caribe, jazz desconstruído e R&B que vem apaixonando críticos e melómanos, ganharia com um alinhamento mais curto, a depurar a família de canções daqueles instantes em que umas se parecem mais com outras e a sensação de repetição deslustra o êxito retumbante dos melhores momentos. Posto esse detalhe de lado, há aqui carisma mais do que suficiente para deliciar os apreciadores de bom experimentalismo de fusão. 

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sexta-feira, 13 de março de 2015

Da dormência colectiva à fidalguia da politiquice


A estranha dormência colectiva com que os povos ocidentais da Europa legitimaram, no último par de décadas, a ascensão de uma elite política sofrível e de moral (muito) controversa teria lugar em qualquer compêndio sociológico. Nem é caso exclusivo cá do burgo, onde se vão conhecendo tristes (mas importantes) manifestações de um epifenómeno que fere fatalmente o elo fiducial entre eleitos e eleitores e que se revelou, em momentos diferentes, um pouco por toda a parte, de Espanha a Itália, da Alemanha à França. Passos Coelho é apenas o mais recente inscrito num longuíssimo histórico de factos que devem preocupar-nos a todos. A discussão já nem deve estar no facto de o primeiro-ministro se ter esquecido ou se desconhecia uma obrigação contributiva que não podia esquecer nem desconhecer ou no montante em questão. Embora esses sejam detalhes sérios demais para passar ao lado, o que mais inquieta é a branda oposição do Partido Socialista a isto tudo. A esquerda mais à esquerda, sempre panfletária e rígida, não desaproveitou a oportunidade de radicalizar e pedir a demissão de Passos Coelho, cumprindo (bem) o seu mandato ideológico. Faça-se justiça a essas esquerdas: dormentes não são. Já o PS, ambíguo e vacilante como tem sido no costismo (e já o era no segurismo), assombrado pelo cárcere de Sócrates, ficou a ver a poeira assentar. Os custos políticos disto, para governo e oposição, hão-de contar-se num futuro próximo. Em todo o caso, o PS é o natural sucessor na alternância política do costume e, ao colar-se ao discurso da dormência, à complacente voz daqueles que aceitam o esquecimento/desconhecimento de Passos Coelho como uma ocorrência "normal", está no fundo a acolher o conformismo contemporâneo desta Europa falida. A aritmética é simples: mais de setenta por cento da comunidade electiva lusa está nos socialistas, nos centristas e nos sociais-democratas e todos são, directa ou indirectamente, cúmplices na rendição a esta cartilha libertina que fez da política uma mera politiquice austeritária que exige muito e cumpre pouco. Passos Coelho é só mais um desses príncipes de moralismo roto que povoam os faustosos palácios da lama política, cá e na família europeia. Tantos foram os comensais do banquete infinito que deu (e dá) de comer a muitas bocas, as mesmas que apregoam aos ventos o rigor e a cultura de exigência que não praticam.

E os povos dormem perante isto, permitindo aos fidalgos de pacotilha regalarem-se impunemente, no bailado cínico de cargos e favores, na dança vaidosa de influências de gaveta e poderes de envelope.

E os povos dormem na vergonha de serem representados pelos horríveis e tentaculares monstros que se tornaram essas coisas instituídas como profissionais da política, mendigos das subvenções, privilégios e imunidades, vendidos aos magnos impérios da finança e do capital, sequiosos da última gota da teta pública.

E os povos dormem. Admitem este miserável desfile do despudor, dos esquecimentos e incumprimentos, de empregos de favor e compensações milionárias.

E se os povos dormem esse sono colectivo, numa cegueira inerte que não vê porque não quer ver, que não age porque não quer punir, que não pune porque, afinal, apenas quer um quinhão do "bolo" para si, as sociologias enxergariam uma verdade perturbadora, atrás dos panos opacos:  os povos e os eleitos são prole da mesma moral viciada e dela herdam defeitos e ambições. No fim, somos todos a mesma família. Só os despertos é que pagam.


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quinta-feira, 5 de março de 2015

Pond - Man It Feels Like Space Again

7,7/10
Caroline, 2015

A inopinada revelação dos australianos Tame Impala, nos últimos anos, abriu portas para os conterrâneos (e mais antigos) Pond, também oriundos de Perth e que vêm "emprestando" alguns dos seus integrantes ao colectivo de palco daqueles. Essas sinergias circunstanciais fazem sentido por nascerem da comunhão de estilos entre as duas trupes, ambas envolvidas na onda revivalista do psicadelismo que colheu simpatias em larga escala, um pouco por todos os quadrantes do panorama musical. Ainda assim, e a despeito da coincidência nas referências e da partilha de músicos, não há muito mais coisas em comum entre os Pond e os Tame Impala. Desde logo, a abordagem aos espaços psicadélicos é substancialmente diferente, sem apreciações de valor: o que nos Tame Impala é estrutura, nos Pond é improviso, o que nos Tame Impala é disciplina, nos Pond é desaforo, o que nos Tame Impala é afectação, nos Pond é relaxe. Tudo isto são motivos de sobra para a empatia instantânea que a música dos Pond fomenta, graças ao talhe descontraído e à intuída anarquia formal a que elasticamente se adapta e que tão bem serve os propósitos do psicadelismo.

À nascença este Man It Feels Like Space Again, sexto opus em outros tantos anos de existência, tinha já sobre si o oneroso encargo de suceder ao par de discos mais louvado, cada qual à sua maneira, na discografia dos Pond. Na forma, nada de especialmente revolucionário: estão cá as tradicionais ferramentas rock (que eles revolvem como poucos) e, talvez um pouco mais notadas, as cores dos sintetizadores. Mesmo não sendo o mais experimental dos discos dos Pond, Man It Feels Like Space Again é uma guloseima caleidoscópica, com teatralidade a rodos, com contrastes de tempo, tom, ambiente e direcção, com canções de géneros e feitios que mudam. E isso é, no fim, a fascinante identidade dos Pond.

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quarta-feira, 4 de março de 2015

Bizarra Locomotiva - Mortuário

8,2/10
Rastilho Records, 2015

Num meio musical pouco dado à crueza do torpemente chamado rock industrial, os Bizarra Locomotiva souberam impor-se, ao longo de uma vintena de anos, como voz nacional líder desse movimento que, sendo ingenitamente marginal - por professar um surrealismo corrosivo pouco amigo de ouvidos dóceis -, atinge circunstanciais picos de visibilidade e mediatismo. Um desses estados de graça momentâneos aconteceu para os BL (ainda com Armando Teixeira), com a inesperada maturação artística mostrada em Bestiário (1998) que, depois das manifestações incipientes que o antecederam e volvidos todos estes anos de percurso, veio a tornar-se charneira na discografia da trupe de Rui Sidónio, por ter inaugurado verdadeiramente uma linguagem musical plausível para o futuro, granjeando a pulso um espaço no (então) muito pouco atrevido orbe musical português. De então para cá, e depois do menos inspirado Homem Máquina (2002), Armando Teixeira desistiu e temeu-se que a locomotiva saísse dos carris. Com Ódio (2004), primeiro, e sobretudo com Álbum Negro (2009), o cepticismo desse prognóstico foi desmentido, sem apelo nem agravo. Esse par de registos desferia uma nova ebulição e amplitude na música dos BL, tão cáustica e autoritária como antes, mas mais precisa e objectiva na construção de ambientes (e canções), sem prescindir do sedimento identitário de Bestiário.

Este Mortuário aceita a escolta do passado recente, segue-lhe os méritos e sublima-se numa ópera industrial, como a própria banda gosta de rotulá-lo. O propósito era, na concepção teórica, construir um disco capaz de capturar a alma incendiária das actuações ao vivo. E, de facto, Mortuário, sendo um dos registos mais ásperos (na música e nos textos) do grupo, conserva a profusão de energias que eles libertam em palco, muito à custa do acrescento de resíduos próprios dos live takes, como as ressonâncias de público e instrumentos, por exemplo. Musicalmente, é inegável que se acham aqui alguns dos mais sumptuosos trechos da carreira dos BL - e até cabe uma revisão livre de "Intruder", de Peter Gabriel - e, também por isso, Mortuário enriquece aquele imaginário agudo e sinuoso com que os decanos do rock industrial nos vêm colonizando a mente há anos, à força de ácidos que fervem. Sem válvula de segurança.

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segunda-feira, 2 de março de 2015

Os Capitães da Areia - A Viagem d' Os Capitães da Areia a Bordo do Apolo 70

7,9/10
Amor Fúria, 2015

Não tínhamos notícias discográficas deles há quase quatro anos quando, pela Amor Fúria, nos deram o primeiro registo com corpo de álbum, no seguimento de um punhado de canções soltas que puseram sobre Os Capitães da Areia a curiosidade dos melómanos nostálgicos dos anos 80 da pop lusa. Quando passou o efeito desse disco (O Verão Eterno), embora sem expressão mediática verdadeiramente significativa, ficamos convencidos de que naquele quarteto de "capitães" radicado em Lisboa havia sumo suficiente para muito mais. No fundo, os rapazes davam-nos um cheirinho do que podia ser música pop (ou pope, como eles preferem grafar) jovial e soalheira, com a luminária sempre presente de gente como os Heróis do Mar ou os Radar Kadafi, mas capaz de acolher referências de contemporaneidade oportunas. Ainda assim, poucos adivinhariam que no regresso do grupo aos discos, depois do quase silêncio dos últimos tempos, estaria um espirituoso álbum conceptual, coisa rara cá pelo burgo e mais própria de criaturas enfatuadas. E, mais ainda, que esse disco tivesse como mote a viagem intergaláctica do agora quinteto, a bordo do velhinho centro comercial Apolo 70, feito nave de ocasião.  Na história musicada que segue o alinhamento desfilam convidados de vários quadrantes; a saber, sem nenhuma ordem em especial: Capitão Fausto, José Cid, Samuel Úria, Toy, Rui Pregal da Cunha, Tiago Bettencourt, Bruno Aleixo, as Adufeiras de Monsanto, Miguel Ângelo, Lena D'Água...e a lista continua, em setenta e cinco minutos de música sem interrupções.

Na proposta musical propriamente dita, há motivos de sobra para considerar que este álbum pode figurar nos momentos históricos da pop portuguesa, não apenas porque raramente os protagonistas da nossa cena musical arriscam desta maneira, mas sobretudo porque a música que aqui vem é boa. O psicadelismo electrónico e o desprendimento formal moram aqui, como convém numa empreitada deste género, mas a produção apuradíssima (a cargo do "boss" Manuel Fúria) é o verdadeiro fio condutor que dá sentido à saturação de ideias desta viagem louca. Refine-se tudo com sentido de humor (mesmo com alguns interlúdios inanes) e aí está um disco com uma virtude incomum e que passará despercebida aos mais presunçosos: é o álbum conceptual menos pretensioso da história.  E isso só pode ser coisa louvável. Afinal, é bom quando nos levamos menos a sério.

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