Conhecida (e apreciada) pela camaleónica e nada ortodoxa capacidade de se reinventar a todo o momento, a islandesa Björk tornou-se, nos anos mais recentes, um dos ícones mais reverenciados da pop. Divisora de opiniões, ela integra, afinal, o restrito lote de artesãos a que poucos ficam indiferentes, não sendo de espantar a expectativa que o seu décimo álbum de estúdio (descontando a parceria com o marido Matthew Barney no filme Drawing Restraint 9, de 2005) suscitou na comunidade melómana. Depois de ter testado, com a elegância costumeira, a elástica potência da sua voz nas quase-canções de Medúlla, há três anos, Björk retoma alguns dos pressupostos da sua identidade musical, pontuados aqui pelo reencontro com a electrónica e um certo formalismo (se é que isso é possível com Björk...) e pela reconciliação com a versatilidade estética dos melhores instantes da sua carreira. Nesse particular, Volta convoca passados e futuros na forma de sons com pressupostos e latitudes bem diversas, propondo-nos o devaneio da conjugação do puro tribalismo (sabor transversal ao álbum) com a electrónica extrovertida (o single "Earth Intruders", com a percussão dos Konono n.º 1, é exemplo), ou da fragilidade do experimentalismo com ciências asiáticas (escutem-se "I See Who You Are" e "My Juvenile", com a chinesa Min Xiao-Fen); no caldeirão cabem ainda a oportunidade do jazz vanguardista (como na cinematográfica "Vertebrae by Vertebrae" ou na plácida "Pneumonia"), a exaltação do noise (no festim de "Declare Independence", ao lado de Brian Chippendale, dos Lightning Bolt), o flirt com África ("Hope", com a inconfundível kora do maliano Toumani Diabaté) ou o cortante e soturno romantismo ("The Dull Flame of Desire", com os vocais andróginos de Antony Hegarty). Os delírios electrónicos têm a mão de Marc Bell (repetente nestas andanças) e a arrumação da casa é do ubíquo Timbaland. No global, a despeito de um punhado de adições oportuníssimas ao já preenchido ideário de Björk e da dimensão "fresca" que a islandesa sempre põe no que faz, Volta deixa a impressão de que as construções provindas dessas ideias raramente são tão consequentes como se imporia e, por isso, se assemelham a bosquejos inacabados das canções que podiam ter sido. O que, sendo uma deformidade indisfarçável, no caso de Björk, é traço típico (às vezes, com medidas de mérito) e, também neste caso, não potenciador de unanimidade.
quinta-feira, 10 de maio de 2007
Björk - Volta
Conhecida (e apreciada) pela camaleónica e nada ortodoxa capacidade de se reinventar a todo o momento, a islandesa Björk tornou-se, nos anos mais recentes, um dos ícones mais reverenciados da pop. Divisora de opiniões, ela integra, afinal, o restrito lote de artesãos a que poucos ficam indiferentes, não sendo de espantar a expectativa que o seu décimo álbum de estúdio (descontando a parceria com o marido Matthew Barney no filme Drawing Restraint 9, de 2005) suscitou na comunidade melómana. Depois de ter testado, com a elegância costumeira, a elástica potência da sua voz nas quase-canções de Medúlla, há três anos, Björk retoma alguns dos pressupostos da sua identidade musical, pontuados aqui pelo reencontro com a electrónica e um certo formalismo (se é que isso é possível com Björk...) e pela reconciliação com a versatilidade estética dos melhores instantes da sua carreira. Nesse particular, Volta convoca passados e futuros na forma de sons com pressupostos e latitudes bem diversas, propondo-nos o devaneio da conjugação do puro tribalismo (sabor transversal ao álbum) com a electrónica extrovertida (o single "Earth Intruders", com a percussão dos Konono n.º 1, é exemplo), ou da fragilidade do experimentalismo com ciências asiáticas (escutem-se "I See Who You Are" e "My Juvenile", com a chinesa Min Xiao-Fen); no caldeirão cabem ainda a oportunidade do jazz vanguardista (como na cinematográfica "Vertebrae by Vertebrae" ou na plácida "Pneumonia"), a exaltação do noise (no festim de "Declare Independence", ao lado de Brian Chippendale, dos Lightning Bolt), o flirt com África ("Hope", com a inconfundível kora do maliano Toumani Diabaté) ou o cortante e soturno romantismo ("The Dull Flame of Desire", com os vocais andróginos de Antony Hegarty). Os delírios electrónicos têm a mão de Marc Bell (repetente nestas andanças) e a arrumação da casa é do ubíquo Timbaland. No global, a despeito de um punhado de adições oportuníssimas ao já preenchido ideário de Björk e da dimensão "fresca" que a islandesa sempre põe no que faz, Volta deixa a impressão de que as construções provindas dessas ideias raramente são tão consequentes como se imporia e, por isso, se assemelham a bosquejos inacabados das canções que podiam ter sido. O que, sendo uma deformidade indisfarçável, no caso de Björk, é traço típico (às vezes, com medidas de mérito) e, também neste caso, não potenciador de unanimidade.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário