quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Wyatt & Ayers



Comicopera
7
/10
Domino
2007
www.strongcomet.com/wyatt


The Unfairground
7
/10
Tuition
2007
www.kevin-ayers.com


Ironia dos tempos, o lançamento quase coincidente dos novos discos de Kevin Ayers e Robert Wyatt, ex-membros insignes dos incontornáveis Soft Machine, quase insinua uma "reunião" casual. E se esta quase simultaneidade não concretiza aquela que seria uma óptima notícia para fãs de longa data - afinal eles não gravam nada juntos há quase três décadas! - pelo menos tem o mágico condão de nos permitir um emparelhamento imaginário de dois senhores do mundo art rock.

Dos dois, Robert Wyatt é o que vem mantendo um ritmo de edições mais certo e Comicopera é um exercício de continuidade na esteira do antecessor Cuckooland, repetindo as colaborações de Brian Eno, Phil Manzanera e Paul Weller. O jazz livre de atilhos é a luminária de um disco dividido em três actos e que não se impõe fronteiras estéticas e, bem ao jeito da sorumbática esquizofrenia de Wyatt (eventual reminiscência do passado com os Soft Machine), é um deleite experimental, num equilíbrio movediço entre cacofonia e a elegância melódica. E traz os poemas acerbos do costume, como o tímido álbum contestatário de um homem que, preso a uma cadeira de rodas há mais de vinte anos, nunca deixou que o infortúnio lhe poluísse o espírito crítico.

O regresso de Kevin Ayers tem o impacto de pôr termo ao silêncio de cerca de uma década e meia em que o músico se escondera. Feito de canções escritas sem o fito na edição, The Unfairground é um disco penetrante pelo seu pessoalismo e revelador, ao contrário do discurso "virado para fora" de Wyatt, de reflexões interiores. E é nesse intimismo que o disco surpreende, voltando costas à previsível toada de desencanto e desvendando uma sincera exaltação de relatos da vida como ela é. Aí, Ayers mostra uma voz com alguns desdobramentos emocionais e, sobretudo, nutrida com o optimismo próprio de um homem em paz com a vida. Os arranjos são altivos e estendem as canções a outras amplitudes, transformando-as de simples registos isolados de crooner em peças de pop de elite.

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