Já não pode negar-se, mesmo sob os entusiasmados atropelos ao bom senso que as opiniões de massa como generalizações instantâneas tendem a quase sempre encerrar, que o mundo indie ficou diferente depois do surgimento dos Animal Collective. Com um punhado de álbuns pautados essencialmente por uma barroca (porque exuberante e "anormal") revisão dos ideários pop-rock, Panda Bear e Avey Tare (com a ajuda de Geologist e Deakin) ergueram uma estética cultora da transversalidade da música e, sobretudo, do experimentalismo em busca de convergências entre estilos. No decurso da evolução dessa linguagem, desde as deliciosas desproporções e desalinhos de Here Comes the Indian (2003), trabalho com que se mostraram às gentes melómanas, ou, se preferirmos um recuo mais distante, desde as gravações de 2001 que foram lançadas no ano transacto sob o título Hollindagain, até à grandeza de Feels (2005), é notória a depuração de formas das composições e a consequente emancipação de um pendor melódico concreto - outrora um mero ingrediente clandestino atrás do tropel dissonante das texturas.
Foi assim que, como muito bem sublinha este Strawberry Jam, o crescimento da melodia aproximou os Animal Collective dos paradigmas "clássicos" de canção, não esvaziando minimamente a superabundância orgânica das peças, sempre servidas por electrónicas extáticas e instrumentações intencionalmente "poluídas" e no limite do excesso. Pois é desses desmandos que se faz a melhor música dos Animal Collective e é com eles que o universo periférico (e bizarro) de Panda Bear e Avey Tare ganha forma. Como se o surrealismo (ou, por intimidades directas, o subconsciente) pudesse ter um equivalente em forma de música, assim soam as transcendentes construções de Strawberry Jam, pejadas de excitantes alucinações, de sons quebradiços e ebulientes e de referências escapistas. Desta vez, porém, não obstante essa irreverência estética a que já chamaram neopsicadelismo estar intacta, o nervo melódico dos Animal Collective surge mais disperso (ou menos inspirado?) e, mesmo nunca caindo no conformismo, parece ser menos orientado do que em Feels. Seja isso sinal de uma passagem retrocedente ou sugestão de uma via alternativa, a incerteza melódica é o mais natural dos reflexos colaterais da cavalgante torrente criativa do quarteto. A diferença é que eles já a disfarçaram (ou domaram) bem melhor no passado.
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