Quem escuta a música de Benjamin Biolay tem algumas dificuldades, pelo menos nas primeiras audições, em associar a sensibilidade artística do compositor gaulês ao mau génio que tantas vezes lhe é atribuído (e que alguns pormenores da sua vida pessoal concretizam). Canções como as de Trash Yéyé, sexta obra de um percurso discográfico com cinco anos, não parecem fruto de uma mente isolada e separatista face ao cancioneiro tradicional da chanson française que, queira ou não admiti-lo, é a sua luminária basilar. Ainda assim, justiça lhe seja feita, Biolay ergueu para si uma identidade que não se fecha em reminiscências de Gainsbourg ou Ferré, nem teme proferi-las em tons mais negros e abraçando temáticas de recorte existencialista, as mais das vezes em volta de episódios de amores frustrados. Servidas por uma voz sussurrante e, sobretudo, por arranjos com certas derivações de talhe sinfónico, dir-se-ia que as peças de Biolay se acham num elegante registo de pop de câmara que não impede incursões oportuníssimas por outras órbitas estéticas, sejam elas do jazz formalmente ligeiro ou da electrónica (ouça-se, como exemplo, a bem dançável "Qu'est-ce que ça peut faire"). E, mérito inegável (e típico) do cantautor, essas variações de forma das canções não trazem sombra de incongruência ao disco, antes lhe acrescentam a diversidade própria dos álbuns recheados de surpresas. Mesmo não sendo tão inspirado quanto Negatif (2003), opus maior do catálogo Biolay, Trash Yéyé é um nobre exercício do que deve ser a pop a preto e branco e um generoso exemplo do que vai valendo actualmente a música francesa.
Posto de escuta Sítio da Virgin
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