Se o panorama actual da música de Brooklyn se tem notabilizado pelo recrudescimento de uma impressionante colheita de novos projectos de rock independente, isso não quer dizer que, nas sombras desse movimento afirmador da vitalidade criativa da cidade, não caibam outros géneros musicais. Prova disso mesmo é o fresquíssimo entusiasmo em torno do projecto Hercules and Love Affair, de Andrew Butler. Ele é um DJ e promotor de eventos que, antes de chegar ao conhecimento de Tim Goldsworthy, um dos "patrões" da DFA, tinha já um caminho percorrido na culture club nova-iorquina. Entre inúmeras festas e mostras da sua actividade de DJ, Butler foi abrindo espaço a criações originais que, agora, chegam à forma de disco, depois de um par de singles editados. Se, inicialmente, o vinil 12" Classique #2/Roar, empoladamente lançado pela DFA, no final do ano transacto, como produto de uma estética "euphoric disco", passou praticamente despercebido aos públicos fora do orbe da música de dança, foi com "Blind", vocalizado por Antony Hegarty (ele mesmo, dos Antony and the Johnsons), que o conceito Hercules and Love Affair veio a merecer a curiosidade de mais gente. A servir de aperitivo para o álbum que agora nos chega, a canção desvendava genuínos sabores retro, com as batidas cíclicas da disco e discursos de sintetizador e um registo de Antony arrumado num cenário bem diferente daqueles que dera a conhecer antes, ou a título pessoal ou nas inúmeras parcerias que assinou nos últimos anos (Lou Reed, CocoRosie, Joan as a Police Woman, Rufus Wainwright, Current 93). Terá sido, de resto, o facto de Antony emprestar a sua voz a metade dos trechos do alinhamento da homónima estreia em disco de Hercules and Love Affair que aproximou deste disco, além dos adeptos incondicionais da música electrónica e de dança, uma falange de curiosos e habituais consumidores de outras estéticas. Depois, o pormenor do disco ser apadrinhado pela DFA, um dos mais entusiasmantes poisos de artistas da actualidade, ajudou a exponenciar curiosidades sobre as reais virtudes das criações de Andy Butler quando passadas à forma de álbum.
A esse propósito, Hercules and Love Affair não esconde fundações genéticas de clara nostalgia disco, recuperando uma moldura estética mal-amada no seu tempo mas que, fruto de fôlegos regeneradores pontuais, não só nunca deixou de contaminar as criações electrónicas de cada época, como ciclicamente renovou a sua actualidade. Percebendo a oportunidade de usar a nostalgia por essa estética e reinventá-la com um upgrade de minudências técnicas e, sobretudo, uma proveitosa inclinação pop, Butler confere ao projecto Hercules & Love Affair a ambivalente condição de juntar saudosismo e contemporaneidade. Se juntarmos a essa inesperada dinâmica, a capacidade mutante que as composições revelam (sempre no formato disco) e as mudanças de registo vocal (além de Antony, a heroína da nova soul Nomi e Kim Ann Foxman também cantam), Hercules and Love Affair tem todos os condimentos para saciar melómanos de qualquer quadrante. Mesmo aqueles que franzem o nariz aos sons disco...
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