domingo, 8 de outubro de 2006

Rafael Toral - Space

Apreciação final: 7/10
Edição: Staubgold/Flur, Setembro 2006
Género: Electrónica Experimental/Vanguardista
Sítio Oficial: www.rafaeltoral.net








Embora ainda seja uma incógnita para a generalidade do público melómano luso, Rafael Toral é um dos expoentes da arte experimental portuguesa. Dotado de um espírito desassombrado e de um interesse vigilante pelas múltiplas dimensões virgens da música, Toral consagrou as suas jornadas criativas à distensão dos limites do improviso, também à sondagem de novos valores intrínsecos a cada partícula sonora, seja ela ingénita de um instrumento, seja obra de manigâncias digitais ou ainda, recurso peculiarmente incluído na música de Toral, seja inferência de especulações com a estática e o feedback. Especulativo é certamente um adjectivo próprio da música de Toral, como bem se instrui neste Space, primeiro tomo de um ciclo novo do músico dedicado à pesquisa das contingências do som. A tal ofício é incumbido, no papel de agente primaz que fora da guitarra noutros trabalhos, o discurso de um amplificador portátil alterado, cerne gravitante do disco, cuja posição relativa face ao microfone produz uma gama de sons inconstantes, vagabundos do vácuo que talham o silêncio à medida dos gestos periciais de Toral. Não se espera de Toral a lealdade a máximas teóricas; ele é fundamentalmente um artesão do empírico à procura do futuro. Sente-se isso na gestão prudente dos cromas de Space, ora poluídos de irradiações energéticas vibrantes e de feedback processado, ora deixados ao acaso dos contrastes bipolares som/silêncio, sempre vanguardistas e em ambivalência oportuna para o reforço da compleição hipnótica do álbum. O jazz é, como não poderia deixar de ser, uma alusão imponderável, sem formalismos estéticos, poligonal como o de Alvin Lucier ou David Toop, lapidado como o de Fennesz ou Fullerton Whitman, enigmático e fértil como o do austríaco Pita ou dos Jazzkammer. O futuro do jazz diz-se nestes códigos electrónicos.

Space não é tomo para ouvidos preguiçosos ou mentes amestradas. Sem música de cânone, tampouco música em sentido estrito, o novo exercício de Toral transcende qualquer definição de álbum. Não há aqui canções ou estruturas tipificadas, o limite é o espaço sideral. Space é uma viragem cósmica de Toral, depois de uma década e meia a fundir guitarras e electrónica. Agora o sci-fi é a luminária dominante da anfibologia harmónica do disco, sem remates vincados. Esse instinto tantalizador, a par da parcimónia estética do disco, marcam uma consciência diferente de Toral e, em última análise, uma intimidade acrescida entre som e espaço, homem e circunstância, como escreveu Ortega y Gasset. Com Space, Toral somou outra refracção inexorável à máxima do filósofo espanhol: tal como o Homem, a música, ou o som (por extensão conveniente), também se faz de circunstância.

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