sábado, 24 de fevereiro de 2007

Deerhunter - Cryptograms




Dizem os dicionários que criptograma é um documento escrito com caracteres secretos e, portanto, de árdua descodificação. A escolha do epíteto para baptizar o primeiro registo do quinteto Deerhunter pela Kranky não vem a despropósito e, escutando atentamente este Cryptograms, notam-se duas identidades no alinhamento e qualquer uma delas com encriptação própria. A metade inicial, de matriz manifestamente menos imediata e espacial, revela uma curiosa perspicácia para incorporar fragmentos da doutrina pós-punk e o fino traço da fantasia electrónica, como nas utopias de Eno, de criatividade vaga e com tendências disformes. No segundo pólo, abre-se a janela pop do colectivo, não no sentido mais óbvio da pop precipitada e rudimentar, antes seguindo os trilhos ensimesmados do shoegaze. As canções tornam-se mais abertas (também mais estruturadas), por oposição a uma certa excentricidade orgânica da outra metade, têm mais voz e menos escapismo electrónico. No final, a bipolarização não é sinónimo de psiques dúbias, nem de acidentes de identidade; pelo contrário, é indício de um colectivo com linguagem própria e que, a despeito de um ou outro delito mínimo e próprio de um código musical lato, espelha apuradamente o alinhamento entre inocência e tensão que, em tempos, fez dos Sonic Youth um símbolo.

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