Immune, 2013
A alma musical de Tiago Sousa esteve sempre dividida entre o improviso próprio de um artífice autodidacta, de rédeas livres, e o pragmatismo técnico de um executante culto nos ideários eruditos. Algures entre esses pólos, mora uma linguagem singular, não no sentido de ser particularmente inovadora ou excêntrica, mas sobretudo por revelar um contagiante desassossego, a que não é estranha a tal dicotomia entre técnica e devaneio. Nessa linha, a música de Tiago Sousa tornou-se, com as derivações formais conhecidas (aqui em exercício puramente individual), um veículo das suas próprias convulsões emocionais, vertidas habilmente num discurso de notas pesadas e, por isso mesmo, pejadas de espiritualidade. Era assim também nos trabalhos coadjuvados por outros músicos, mas faz-se mais evidente neste Samsara, um álbum inspirado no esoterismo "importado" da filosofia das migrações das almas das religiões orientais. Essa espiritualidade é uma evidência transversal às quatro peças do disco. O quarteto de composições partilha um vago sentido melódico, assente na já conhecida atonalidade de Tiago Sousa, a mesmíssima matéria de que ele se socorreu noutros trabalhos para nos levar a deflexões melódicas inesperadas e com que, agora, nos volta a aliciar irremediavelmente para um escapismo despojado, contemplativo e só. É de solidão que se trata, a do piano e a nossa, a das notas depositadas minuciosamente no silêncio, em progressão lenta, à procura de livrarem-se da tensão tétrica que as assombra. A luz é uma centelha distante.
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