segunda-feira, 14 de julho de 2008

Beck - Modern Guilt

8/10
Interscope
XL Recordings
2008
www.modernguilt.com



Com um percurso marcado pela vontade de percorrer as várias etapas de uma metamorfose artística sem destino estético definido, Beck é um dos sujeitos menos conformistas e um dos ícones principais da nação pop contemporânea, mormente pela acuidade com que vem insistindo na redefinição dos paradigmas de canção. É graças a ele, sobretudo na década de noventa, que as arraigadas visões tradicionais do cancioneiro pop são expostas a contaminações exteriores ao seu cânone e a uma criatividade revisionista que acabou por lhes somar influências de outras órbitas estéticas. Foi assim que, paulatinamente, a identidade musical de Beck se impôs como um produto híbrido e virtualmente inclassificável, ainda que subjacente às estruturas populares de canção. Com influências importadas do psicadelismo, da electrónica, dos blues ou até dos costumes folk, a música do multi-instrumentalista americano foi, em alguns casos com reflexos figurativos evidentes nas capas dos álbuns, um produto musicalmente equivalente do neo-expressionismo (ou da sua hiperbolização, o movimento cinquentista da art pop). Essa definição, volvidos quatorze anos da impressiva estreia discográfica, continua a ser um dos poucos rótulos justos que se podem colar a Beck e, com especial propriedade, a este Modern Guilt.

O mais curioso é que, mesmo sendo este o décimo álbum de Beck, o disco finta habilmente a familiaridade dos ouvintes face aos ingredientes idiossincráticos do americano, moldando-os numa massa sonora surpreendentemente capaz de insinuar novidade e imprevisto numa linguagem sobejamente conhecida e sem segredos. E esse é o melhor encómio que pode escrever-se sobre Modern Guilt, o de revalidar a efectividade do nomadismo estético de Beck que, mesmo travestido de ressaca festiva, psicadélica e espiritual (cortesia da co-produção do ubíquo Danger Mouse) é capaz de construções melódicas niveladas com o escol de Beck ("Gamma Ray", "Chemtrails", "Youthless" ou "Soul of Man" são o quarteto altivo). Não obstante um substrato mais melancólico do que os seus antecessores recentes, Modern Guilt é penetrante e vigoroso, cheio de truques sonoros apetitosos e, porque vem resumido em trinta e quatro lacónicos minutos de música, torna-se uma experiência rápida e intensa. Quando cessa o último acorde, fica o suspiro para voltar ao ponto de partida e gozar voluptuosamente o melhor Beck desde Sea Change.

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