segunda-feira, 7 de novembro de 2005

Murcof - Remembranza

Apreciação final: 7/10
Edição: Leaf, Setembro 2005
Género: Electrónica Minimalista/Experimental
Sítio Oficial: www.murcof.com








Murcof é um mexicano de Tijuana. Ninguém o diria, não há na sua música nenhum prenúncio dessa naturalidade. A dádiva musical de Murcof não venera a tradição mariachi, nem o espírito vadio da música tradicional mexicana. Aqui, o projecto é radicalmente diferente. As criações de Fernando Corona - assim se chama o senhor - seguem a cartilha da electrónica minimalista. A orgânica aparentemente simples das composições é um fluido musical que conjuga elementos sintéticos, verdadeiros cicerones da melodia e marcadores do compasso das faixas, e incursões superficiais no domínio da música clássica. Desta junção, quase sempre conseguida com lucro, resulta um composto estável, de grandeza atmosférica e alma escurecida. A música de Remembranza é um crescendo de paixões: por vezes, desenha-se na mente, espectral e enevoada, com a frágil leveza de um fantasma que baila na vibração de um piano; noutros momentos, essa dimensão incorpórea, quase sobrenatural, amplia-se a si mesma, os ruídos nocturnos ecoam e a música toma o corpo do medo, faz-se mais intimidativa. As melodias redundam, assim, num sublinhado da face tétrica das fantasias, uma espécie de anátema anti-existencialista, sem forma decretada, que cruza com erudição, os universos sintéticos dos Pole, de Aphex Twin, Brian Eno ou Ulrich Schnauss com a inspiração inventiva de Gyorgy Ligeti ou Arvo Part. Entre esses dois mundos, Murcof maquina um simulacro de guerra fria, o palco assombrado de experiências acústicas de cariz fílmico, como etapas da percepção de um mundo sensível.

Boa parte da energia activa deste Remembranza deriva da sua estranheza polimórfica e tensão ressonante que, se não dominam de imediato o ouvinte, o impelem a o confronto com o medo, pelo constrangimento descontrolado da curiosidade. Ter medos é uma inevitabilidade da condição humana. Murcof sabe-o e expia as suas inquietações numa fórmula musical que nos chama para um dédalo denso e medonho. Vamos esquivar-nos a este gesto vanguardista ou o a curiosidade pelo mistério é mais forte?

Posto de escutaRecuerdosRiosCamino

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