segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Youth Lagoon - Wondrous Bughouse


8,0/10
Fat Possum, 2013


Muito já se discutiu sobre a importância da capa de um disco enquanto parte indissociável da integridade do produto artístico e, também por isso, uma variável importante na identificação do ouvinte com o conteúdo. Em certa medida o crescendo imparável dos formatos digitais veio a mitigar esse papel e, hoje, muitos consumidores de música prescindem da capa e nem chegam a conhecê-la senão esporadicamente. No caso do segundo registo de Trevor Powers, o norte-americano atrás de Youth Lagoon, a simples observação da capa, sobretudo em comparação com a do antecessor, anunciaria uma fractura qualquer. No lugar da rigidez que era então intuída na imagem austera de uma escarpa tocada por um arco-íris tímido, mora agora, neste Wondrous Bughouse, um delírio esfuziante de cor e surrealismo. Sendo Youth Lagoon uma identidade musical tão carregada de dimensões imagéticas, o contraste estético não seria inocente: é claro que o disco corporiza uma viragem musical, talvez não tão radical quanto as capas apregoavam, mas com cambiantes consideráveis. Quem esperar um tratado minimalista como foi The Year of Hibernation, desengane-se: a música deixou de ser caseira e envergonhada. A expansão é notória, de tal forma que o intimismo é trocado por uma sonoridade de corpo declaradamente psicadélica e bem texturado. De entre as paredes do quarto para o cosmos.

A nota mais curiosa é que, a despeito de serem servidos por uma produção mais enriquecedora e densa do que antes e de terem um propósito essencialmente escapista, os trechos deste Wondrous Bughouse não hipotecam aquela inocência retraída do debute, antes a fazem crescer em metáforas espirituais que se sentem como o bizarro exorcismo de uma alma à procura de redimir-se da sua própria banalidade e de um mundo em que descrê. E essa viagem é desconcertante nas suas multidimensões, ora magicamente pueril, ora de alucinações venosas. E tantas camadas de som e arranjos quantas as imagens que insinuam na mente; produz-se uma contida e maravilhosa insanidade, uma torrente hipnagógica que toma de assalto a mente e não mais a abandona, em inquietante visita ao lado negro. Como a face mais escura de nós consegue ter tanta cor como em Wondrous Bughouse é um mistério que fica por decifrar.

PODE LER ESTE E OUTROS CONTEÚDOS EM WWW.ACPINTO.COM

Sem comentários: