segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Logos - Cold Mission


8,1/10
Keysound, 2013

Segundo rezam as crónicas, o perfeccionismo de James Parker levou-o a apurar as fórmulas da sua música durante bastante tempo até se sentir seguro do material que inscreveu neste Cold Mission para se apresentar ao universo musical. O britânico é um dos protagonistas da revitalização contemporânea do grime, género com mais de uma década de existência e que, agora, com o recurso às mais modernas tecnologias, parece ressurgir em ondas de entusiasmo e adesão. No fundo, a nova vaga corresponde, em essência, à renovação de uma linguagem sonora marginal que nasceu no começo do século nas rádios piratas londrinas e que, então, dava corpo musical a um certo inconformismo de algumas mentes com pouca vontade de se vergarem às opressões do cosmopolitismo desregrado. Hoje, essa premissa continua tão ou mais válida, haja gente para levar à prática a demanda por um código musical que ofereça aos desassossegados as chances de catarse que anseiam. Neste contexto, o projecto Logos apresenta um som não tão saturado quanto se esperaria de um herdeiro grime, o que sugere a exploração de coordenadas que vão além do legado e denunciam a intenção de uma desconstrução ambiciosa. Declarado o jogo de intenções estéticas, importa descodificar o produto final.

Desde as primeiras notas de Cold Mission se percebe que não se trata de um puro-sangue grime, mesmo partindo de substâncias que imediatamente o associam ao género, como o discurso disruptivo, os padrões rítmicos, a pujança das batidas. Ainda assim, no lugar das texturas saturadas que seriam expectáveis, mora uma curiosíssima interacção triangular entre espasmos sónicos de várias ordens, espacialidade e silêncio (ouça-se "Stasis Jam", por exemplo). Desse triângulo, resulta "música" em estado de suspensão e sem objectivo definido. É como se cada trecho houvesse resultado de pegar avulsamente em inúmeros objectos sonoros (vidros a partir, apitos, pistolas laser, ruídos robóticos, xilofones, ondas do mar, todos processados electronicamente), também no discurso ecoante de MCS e nos ambientes cinemáticos, virá-los do avesso, arremessá-los ao ar e aproveitando a inspiração da sua arrumação casual no espaço, juntar percussões desvairadas de requintado Eskibeat. A coisa nunca será consensual, há-de ser adorada ou detestada. Uns dirão que é uma esquizofrenia inconsequente, outros verão nisto o Santo Graal da electrónica moderna. Não será uma coisa nem outra, mas faz prova de que há território virgem para desbravar nos domínios grime e que Cold Mission pode ser um passo decisivo para o desbravar. E isso não é coisa pouca.

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