terça-feira, 3 de junho de 2008

Spiritualized - Songs in A & E

7/10
Castle
Fontana Universal
2008
www.spiritualized.com



Quando Jason Pierce fundou os Spiritualized, em 1990, depois da falência dos icónicos (e esdrúxulos) Spacemen 3, colocando então um decisivo ponto final num dos mais incompreendidos projectos musicais da vanguarda da música britânica dos anos 80, poucos acreditariam que, na forja, pudesse estar a desvinculação do minimalismo psicadélico com que fez escola e se apresentou ao mundo melómano. E, em substância, os Spiritualized acabaram por afirmar-se como um sucedâneo improvável e mais refinado dos Spacemen 3, derivando de uma ética de especulações alucinogénias e informes, para a paulatina afirmação de uma discografia menos incontinente no "intelectualismo" e, no oposto, mais vocacionada para ver a meta na canção enquanto produto estruturado. Essa demarcação pelo cuidado na forma e, sobretudo, pelo investimento em causas mais consensuais (em certos casos até sinfonistas) da escrita de música, sem contudo perder o fôlego experimentalista e a vontade de desafiar limites, deu aos Spiritualized uma aura, porventura redutora (porque deixa "de fora" a espiritualidade e a empatia com o ruído, por exemplo), de banda dream pop. Não obstante a evidência da menor arbitrariedade do cancioneiro Spiritualized (quando comparado com o dos Spacemen 3), o rótulo é, neste Songs in A&E menos desajustado do que noutros registos. A música que aqui se inscreve é feita de embalos melódicos, de afinidade das texturas com sons orquestrais e das virtudes atmosféricas de misturar uma coisa com a outra, com uma ou outra peça a fugir a essa matriz.

Pondo termo a um silêncio de cinco anos sem gravações e marcado por um internamento hospitalar (daí o A&E do título) anterior às gravações, Songs in A&E é o sexto registo dos Spiritualized e demonstra, como outros tomos antes deste, que Jason Pierce reproduz na música a solução catártica para os ecos das angústias emocionais. Em todo o caso, a inspiração do álbum não se resumiu ao desconforto do infortúnio, ou não fosse verdade que grande parte do repertório já estava escrito antes da doença. Os sinais dessa catarse parecem esgotar-se nos breves interlúdios instrumentais, esses sim imaginados no hospital, ao passo que as canções são convictas e positivas, chegam a ser luminosas, e centram-se, como imporiam as idiossincrasias dos Spiritualized, na reflexão existencialista e na fragilidade da condição humana. O resto é uma experiência musical interessante, com a pompa nos arranjos e a fluidez de escrita que melhor servem uma colecção de canções íntimas e profundamente pessoais.

Posto de escuta MySpace

Sem comentários: