quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Os melhores do ano

O ano que agora finda não foi particularmente inspirado em termos musicais. Marcado pela recuperação de espaço mediático de algumas das estéticas electrónicas normalmente vetadas pelos grandes públicos e, sobretudo, pela febre dos regressos ao palco de míticas bandas do passado, 2008 trouxe-nos, como sempre acontece, boa música, algumas decepções e outras tantas revelações. Espreitemos, então, os melhores do ano desta casa. A primeira nota de destaque, mormente pelo simbolismo de regeneração da escola de sons mais ou menos “perdida” do rock matemático, é a natural consagração da estreia em disco dos americanos Battles como título máximo do ano. Eles não só deram novo fôlego e expressão a uma feição rock mais angular e técnica como, em paralelo, a apresentaram às novas gerações, garantindo a sobrevivência de um género que, por ser pouco dado a seguidismos e modas de momento, é normalmente posto à margem dos canais de distribuição dominante. Do outro lado do Atlântico, o misterioso Burial fez coisa parecida com o seu segundo álbum e merece a segunda posição do pódio, embora noutra órbita, desvendando dimensões novas do dubstep, assim confirmando virtudes do género bem além do habitat natural underground londrino. No último lugar da trindade de excelência, suplantando por muito pouco o magnífico quarto álbum dos conterrâneos The National – claramente os incontestáveis ganhadores do orbe pop-rock – surge a grande revelação da música americana para este ano, os Yeasayer e um disco de estreia esteticamente ambicioso e voltado para as novas coordenadas da folk.

Nos lugares seguintes da tabela, dois esteios da música escandinava: os dinamarqueses Efterklang – que finalmente parecem ter encontrado o complemento de criatividade mais oportuno para o pragmatismo técnico que já se lhes conhecia – e o debutante sueco Alex Willner (The Field), adepto incondicional do minimalismo techno. A estes, seguiu-se a bizarria de Noah Lennox (Panda Bear) que, aproveitando uma pausa dos Animal Collective, nos ofereceu um disco recheado de belas especulações pop. Ainda no domínio dos chamados “projectos paralelos”, o canadiano Spencer Krug (Sunset Rubdown), editou o melhor dos seus discos individuais, demonstrando que a sua verve (e a sua carreira) não depende dos Wolf Parade. O último par de discos dos primeiros dez do ano é encerrado por dois projectos europeus. Sascha Winkler, artisticamente chamado Kalabrese, é o underdog do ano e um valor seguro para anos vindouros, com um impressivo primeiro álbum a merecer escuta atenta. A fechar, os germânicos Einstürzende Neubauten, senhores doutos do rock industrial europeu que, ao fim de trinta anos de carreira, ainda são capazes de reinventar-se.

Cá pelo burgo, o ano de 2008, trouxe uma tardia consagração comercial a Jorge Palma (foi preciso o homem escrever um disco mais comercial para muitos portugueses o ouvirem pela primeira vez!) e confirmou a solidez do estatuto de David Fonseca. JP Simões, o compositor português que deu luz aos Belle Chase Hotel e ao Quinteto Tati, escreveu um dos melhores discos do ano, numa clara homenagem à sua predilecção pela geração setentista da música brasileira. Este foi, também, o ano de afirmação definitiva de três projectos: os Micro Audio Waves que, depois de algum reconhecimento além-fronteiras, viram finalmente a sua música a merecer alguma exposição e o reconhecimento devido, os lisbonenses Hipnotica, cada vez mais um valor firme das tendências mais abstractas da música lusa, e Old Jerusalem, o espaço solitário com que o cantautor portuense Francisco Silva nos vem deliciando. Nas revelações, destacando-se da miríade de edições avulsas que subitamente invadiram o mercado nacional, merecem referência os experimentalistas Tropa Macaca, projecto de Ju-Undo e Símio Superior, com uma belíssima estreia em vinil, o conceito The Partisan Seed, onde o ex-Kafka Filipe Miranda desvenda posturas intimistas e DJ Ride, com uma impressiva primeira aparição, a prometer altos voos num futuro próximo. A finalizar, e porque os últimos podem ser os primeiros, o destaque maior do ano nacional foi o regresso do homem dos sete instrumentos, Júlio Pereira, num sublime exercício de redescoberta das raízes da música lusa e respectivas convergências com espaços e referências sonoras de outras partes do planeta.

E assim se fez música em 2007.

Os dez mais (internacionais):

1.º Battles, Mirrored
2.º Burial, Untrue
3.º Yeasayer, All Hour Cymbals
4.º The National, Boxer
5.º Efterklang, Parades
6.º The Field, From Here We Go Sublime
7.º Panda Bear, Person Pitch
8.º Sunset Rubdown, Random Spirit Lover
9.º Kalabrese, Rumpelzirkus
10.º Einstürzende Neubauten, Alles Wieder Offen

Os dez mais (nacionais):
1.º Júlio Pereira, Geografias
2.º Tropa Macaca, Marfim
3.º JP Simões, 1970
4.º Micro Audio Waves, Odd Size Baggage
5.º Hipnótica, Better Communities For Better Days
6.º DJ Ride, Turntable Food
7.º Mário Laginha Trio, Espaço
8.º Old Jerusalem, The Temple Bell
9.º Blasted Mechanism, Sound in Light
10.º The Partisan Seed, Visions of Solitary Branches

Para consultar a lista completa dos trinta melhores discos do ano, clique aqui.

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