sexta-feira, 1 de junho de 2007

Throbbing Gristle - Part Two: The Endless Not




Desde 1982 que não havia notícias dos londrinos Throbbing Gristle. O segundo acto do agrupamento (sugestivamente baptizado Part Two...), de per si, seria suficiente para suscitar alguma curiosidade em torno do novo trabalho de um colectivo que, no período dourado de expressão industrial do rock na Europa, se fixou como um dos seus mais perversos protagonistas. Com um código sonoro substancialmente mais tortuoso, vanguardista e corrosivo do que o "convencionalismo" dos Young Gods ou dos Einstürzende Neübaten à data, Genesis P-Orridge (hoje Breyer P-Orridge) e seus acólitos preferiram, com o pretexto de uma pretensa liberdade criativa e anti-tabus, abrigar-se sob uma imagética nazista e recorrentes alusões líricas a serial killers, erguendo à sua volta um coro de contestatários que, em efeito contrário, viria a seduzir uma geração de misfits sequiosos de sensações musicais diferentes das da onda punk. Essa nada ortodoxa exploração das potencialidades visuais (e de sugestão temática) da imagem tinha reflexos na cacofónica e sinuosa noção de música do quarteto, exorbitando as fronteiras do conceito industrial - porque nele recolhia as referências estruturais (os drones excêntricos de guitarra, a experimentação digital corrupta e vanguardista e a projecção espacial dos sons) - a favor de uma maníaca, angustiante e depressiva aleatoriedade de sons.

Essas premissas, válidas há um quarto de século atrás, repetem-se neste Part Two: The Endless Not, uma espécie de ensaio dadaísta de música, sem regras e altivo a expor os choques internos entre máquinas e mantras digitais, quais animais-fantasma abespinhados e em assombrada peleja (especialmente notória na arrepiante e paranormal "Lyre Liar"), desconfortáveis no imaterialismo da sua condição. Sons volantes (de almas movediças) estilhaçam-se mutuamente, sublinhando a transgressão ruminante dos samples (a voz de P-Orridge, único elo de aproximação do tomo a dimensões "físicas", é menos usada do que antes) e a impenetrabilidade do disco. Com os mundos fechados, a porta entreaberta para o ouvinte é uma suscitação visceral, uma palpitação mista de medo e desafio. Lá dentro, em orbes de descomunal estranheza (e incontornável (es)pasmo), cabe de tudo um pouco e, embora uma ou outra composição derrape nas suas próprias incertezas e se auto-emascule (até porque a preterição dos abrasivos mais fortes do passado é indisfarçável...), Part Two: The Endless Not funciona como enunciado seguro de um colectivo que, tendo inscrito o nome no mosaico dos notáveis do género industrial, se apresenta agora para o recolocar na órbita certa.

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